quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Por que a atenção à Segurança Pública?


Car@s Amig@s,

Duas das revistas impressas que costumo ler - Le Monde Diplomatique e Caros Amigos [que sou assinante], vieram com o mesmo assunto como Matéria da Capa: Segurança Pública e Violência Urbana.
Chamou minha atenção por ser objeto da minha pesquisa, mas fiquei a pensar do porquê que esta mídia seleta está chamando atenção de seu público refinado...
Por que a "mídia grande" está ocultando o debate sério e comprometido da violência e da segurança pública?
Eu tenho algumas opiniões formadas sobre o assunto e, paulatinamente, divido-as aqui no blog. Depois da leitura percebi que estamos diante de 2 debates importantes, mas que enfocam os mesmo Atores sociais: Polícia e "Bandidos".


Mas a pergunta que não quer calar e que serve para reflexão: quem são de fatos os "Bandidos"?
Este questionamento me incomoda muito, me causa pânico, às vezes revolta, principalmente quando vejo inocentes serem exterminados com a justificativa socialmente aceita e confortante do discurso de "Lei e Ordem".


*Trago a seguir duas matérias da Caros Amigos on-line e deixo a dica do sumário da Le Monde Diplomatique Brasil a quem interessar.


Beijos e obrigada pela audiência bloguística!!!
Dani Felix



Matéria da Capa: VILA REZENDE, JAZIGO 486 Mais um jovem de periferia assassinado pela PM e PM ABORDA UM TERÇO DA POPULAÇÃO DE PIRACICABA
Le Monde
A POLÍCIA NA MIRA: combater a política de extermínio e criar uma nova corporação, por Luiz Eduardo Soares.




VILA REZENDE, JAZIGO 486 Mais um jovem de periferia assassinado pela PM
“Nós, Policiais Militares, estamos compromissados com a defesa da vida, da integridade física e da dignidade da pessoa humana” - inscrição presente em
impressos usados pela PM e em fachadas de batalhões e outras unidades.




A história a seguir é assustadoramente comum e, infelizmente, qualquer semelhança com outras histórias não é mera coincidência. Mudam os personagens, muda a ordem dos acontecimentos, mudam hora e local, mas o final é o mesmo: um jovem inocente morre nas mãos da polícia. Não é mais novidade que aqueles que deveriam garantir a segurança da população levam a morte, semeando ódio e revolta.
Henrique Arnaldi tinha 18 anos e vivia no bairro Cecap II, periferia de Piracicaba, interior de São Paulo. Distante 160 quilômetros da capital, Piracicaba não tem índices alarmantes de violência. Na maior parte do tempo a vida é tranqüila e bem vivida. As ocorrências mais comuns envolvem furtos e roubos de veículos. De janeiro a setembro de 2008, ocorreram 16 homicídios em uma população de mais de 360 mil habitantes. A taxa de homicídios por 100 mil habitantes em 2007 foi de 9,54, bem abaixo da taxa nacional, 51,6.
Próximo à Rodovia do Açúcar, que rasga um mar de canaviais e está sempre abarrotada de caminhões que escoam a produção da região, o Cecap II é considerado pela polícia um dos locais mais “perigosos” da cidade, aqueles onde moram “bandidos” e a repressão se faz necessária. Mas quem caminha pelo bairro não sente medo, nem vê o crime organizado mandando. Ninguém se esconde de balas perdidas nem há toque de recolher. É um local onde todos se conhecem, as famílias são amigas e as crianças brincam nas ruas. No fim da tarde, como é comum na periferia, o bairro renasce depois que todos voltam do trabalho. Há quem vá à igreja – existem várias no bairro – e há quem prefira sentar num banco, bater papo com os amigos ou tomar uma cerveja. As jovens gostam de conversar no portão. Já os garotos preferem cortar o bairro com suas bicicletas ou motos, visitando amigos e se divertindo sobre duas rodas. Não é incomum que até altas horas da noite as pessoas estejam nas ruas.
Henrique era mais um desses jovens apaixonados por motos. Para quem mora longe de tudo, o veículo oferece a oportunidade de conhecer a cidade e ir ao antes quase inacessível centro. Nos fins de semana, é a chance de poder ir a festas sem depender dos ônibus e das caronas, voltando para casa na hora que der vontade. Para Henrique, a moto era a liberdade conquistada com sacrifício. Comprou sua CG Titan azul com o dinheiro que juntou desde o início da adolescência, principalmente trabalhando no Nhô Quim Pneus. O pai queria que ele comprasse um carro e começasse logo a faculdade, mas Henrique preferia a moto. O filho insistiu tanto que acabou convencendo o pai, sem antes prometer que no ano seguinte iria seguir com os estudos. O pai ainda ajudou com um pouco de dinheiro na hora da compra e Henrique saiu da loja com a moto em seu nome. Nada mal para um jovem de 18 anos. O Ensino Médio foi concluído em 2007 no curso noturno da escola estadual Professor Adolpho Carvalho, localizada também no CKP (maneira como os moradores gostam de escrever o nome do bairro). Para a faculdade, o campo de estudos ainda não estava certo.
A incerteza nos estudos era compensada pela determinação no trabalho. O Nhô Quim Pneus era praticamente a segunda casa de Henrique, lá trabalhava de segunda a sexta-feira das nove da manhã às seis da tarde e aos sábados das nove da manhã ao meio- dia. Começou na loja matriz, na avenida Manoel Conceição, na Vila Rezende, bairro do outro lado da cidade. Depois prestou serviços para o Nhô Quim em uma concessionária Toyota e finalmente chegou à unidade na avenida Rio das Pedras, em Piracicamirim, bairro próximo ao Cecap II.
A ida para a Rio das Pedras o colocou novamente com o amigo Edson Teófilo, com quem já havia trabalhado na matriz. Edson é gerente da Nhô Quim e foi no trabalho como um irmão mais velho para Henrique. Sob a supervisão do chefe e amigo, Henrique montava e balanceava pneus, além de cuidar do estoque. Acostumado a trabalhar duro, já tinha carteira assinada havia dois anos e três meses. Sempre sorrindo, era querido por todos e tinha muitos amigos no trabalho.
Henrique trabalhava muito, mas também gostava de se divertir. Sempre que tinha uma chance, saía com os colegas ou com os amigos do bairro. Iam a corridas de moto em Saltinho ou se divertiam em alguma festa nos clubes da cidade, desde que o som fosse pagode ou hip-hop. Nos últimos tempos, confessou aos amigos que estava procurando uma namorada.
Assim como outros colegas no Nhô Quim Pneus, estava ansioso pelo dia 19 de outubro. A colega Tâmara iria alugar uma chácara para comemorar o 17º aniversário. Os funcionários da loja foram convidados e já tinham confirmado presença. Henrique só não sabia que o aguardado 19 de outubro seria seu último dia de vida.



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Deu no Jornal de Piracicaba: ANO 109 Nº 37.809 - 16 de novembro de 2008:

PM ABORDA UM TERÇO DA POPULAÇÃO DE PIRACICABA , por Murilo Biagioli

A Polícia Militar abordou este ano, em operações e durante patrulhamentos preventivos realizados nas ruas de Piracicaba, um terço da população do município. Foram 122,9 mil abordagens na cidade, que possui 365,4 mil habitantes, conforme dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Os números, fornecidos pelo comando da PM, são referentes ao período de 1º de janeiro a 2 de novembro. Em média, isso representa uma abordagem a cada três minutos e meio”.
Você conhece alguém chamado Faisão?
Essa pergunta foi feita aos moradores do Cecap II em quase todos os depoimentos tomados pela Polícia Militar após a morte de Henrique. Quando são parados na rua por policiais, muitos jovens também ouvem essa misteriosa questão. Mas ninguém sabe quem é Faisão. Ninguém conhece chefão algum do crime organizado com essa alcunha. Na imprensa local, nenhuma citação. Nem quando caminhávamos pelo bairro precisamos pedir autorização de “Faisão” para falar com os moradores.
A reação dos moradores nos dias 19 e 20 de outubro não foi capitaneada por pessoas subordinadas a essa entidade quase mística chamada Faisão. Foi um ato impulsivo de uma minoria, uma reação quase instintiva de uma comunidade onde quase todos se conhecem e em que a morte estúpida de um morador honesto gerou sentimentos de impotência, ódio e desespero. Enquanto alguns lamentaram, outros optaram por revidar violência com mais violência.
Entretanto, todos os prejuízos daquela noite de confronto podem ser pagos. O terminal está sendo consertado e segue funcionando. O posto da guarda civil foi reformado e opera normalmente. A única coisa impossível de restaurar é a vida de Henrique. Numa escala de valores, bárbaros não foram os que depredaram tomados de revolta, mas aqueles que tiraram a vida dum jovem sem motivo algum. O maior crime foi feito pelas costas, sem direito a defesa. Uma família foi destroçada.

Mas e o Faisão? Deve estar voando por aí.

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Le Monde:
Editorial, pág. 3: Política do Extermínio, por Sílvio Caccia Bava
Matéria da Capa, pág. 06: A POLÍCIA NA MIRA: combater a política de extermínio e criar uma nova corporação, por Luiz Eduardo Soares





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