quarta-feira, 24 de julho de 2013

Do Brasil e Desenvolvimento, Por João Telésforo

Poder popular

“O poder do povo vai criar um mundo novo”


O poder não está sacralizado em leis imutáveis e nem deve ser visto apenas como ferramenta ou meio para o alcance de um dado fim. Para nós, a multiplicação social do poder é o próprio fim: o alargamento de capacidades e práticas de autogoverno e o fortalecimento da organização insurgente e autônoma das/os oprimidas/dos e das/dos exploradas/os, capazes de recriarem o mundo social sobre novas bases cognitivas e pragmáticas, mediante sua luta pela emancipação. A isso chamamos poder popular.

A realização desse objetivo revolucionário fundamental depende do fortalecimento de sujeitos e processos que instaurem rupturas com o caráter alienante e espoliador do sistema político, cultural e produtivo vigente e construam possibilidades reais de sua superação.

A produção do poder popular exige que voltemos os olhos também, portanto, para as limitações, obstáculos e adversários que enfrenta, bem como as estratégias desenvolvidas para suplantá-los.

Esses obstáculos e limitações são de diversas ordens. Em primeiro lugar, observa-se que as estruturas sociais – capitalistas, racistas, colonizadoras, patriarcais, heteronormativas – produzem, de forma sistemática e entrelaçada, exploração e dominação dos mais amplos grupos populacionais. Por conseguinte, os movimentos sociais contra-hegemônicos, por meio dos quais os povos se mobilizam para construir modelos alternativos de sociedade – igualitários, libertários e cooperativos –, têm papel proeminente na luta pelo poder popular.

Em segundo lugar, é necessário levar em conta que o Estado cumpre papel fundamental na reprodução das estruturas citadas – não por acaso, é um dos grandes violadores dos direitos humanos (senão o maior) e criminaliza movimentos sociais sistematicamente. Por isso, deve-se ter em mente que a luta pela radicalização da democracia invariavelmente entra em choque com a institucionalidade estatal e seus aparelhos de repressão violenta e legitimação simbólica, instrumentalizados pelos sistemas de dominação existentes.

A ação direta deve ser valorizada, portanto, como o mecanismo fundamental de construção do poder popular, de forma autônoma com relação ao Estado capitalista, racista, colonizador, patriarcal e heteronormativo; e, por vezes, em clara confrontação com ele, mediante o exercício democrático do direito à resistência. Ação direta não significa apenas, no entanto, desobediência civil e insurreição; também abarca diversas outras situações e formas de atuação mediante as quais comunidades e movimentos desenvolvem e fortalecem seus próprios meios de sociabilidade, organização política, produção cultural e econômica, com autonomia frente ao Estado e aos grupos dominantes contra os quais lutam.

Por outro lado, não se pode ignorar que a institucionalidade estatal é dotada de fraturas internas: existe certa abertura à participação social (ainda que de forma desigual e violentamente apassivada), bem como é possível pressioná-la em alguma medida para conquistar normas legislativas, políticas públicas e sentenças judiciais que eventualmente podem contribuir ao fortalecimento do poder popular. Disputar as contradições do Estado, de diversas maneiras de acordo com a conjuntura de cada momento, pode ter papel decisivo para obter vitórias nas lutas.

Porém, seria um erro superestimar a abertura procedimental da institucionalidade estatal, que ainda é pequena para as amplas massas populares oprimidas, além de bastante limitada nos efeitos concretos que gera. A necessária democratização radical da sociedade, da produção do poder político, não pode ser feita exclusivamente ou prioritariamente, portanto, “por dentro” das instituições. Não basta alargar a participação popular no Estado, embora isso também seja importante.

O fundamental, fazemos questão de repeti-lo, é a construção de poder dos e com os sujeitos coletivos que se organizam desde baixo, em sua práxis criadora e estimuladora de novas compreensões, mecanismos, práticas e cultura política. A disputa da institucionalidade estatal não deve ser feita como fim em si mesmo nem como objetivo estratégico prioritário, mas de modo organicamente vinculado e subordinado ao fortalecimento desse bloco de lutas.

Índios ocupam o Congresso Nacional, em 2012. Poder dos Povos em construção na luta!

Fonte: Brasil e Desenvolvimento - http://brasiledesenvolvimento.wordpress.com/


terça-feira, 23 de julho de 2013

[Artigo] Confesso que apanhei

por NANCY CARDIA (NEV/USP) para O Estado de S.Paulo
No dia 25 de junho passado a jovem Tayná desapareceu, segundo informações da mãe, a caminho de casa. A mãe fez a denúncia à polícia e procurou identificar a filha nas câmeras de vigilância ao longo do trajeto que ela teria que percorrer. Posteriormente, familiares teriam se queixado de que a polícia não teria levado a sério a queixa, o que talvez explique por que em todas as primeiras notícias do desaparecimento a mãe reiterasse que a filha "não fugiria de casa". Teria ela ouvido tal sugestão na delegacia? No dia seguinte, a polícia prendeu quatro funcionários de um parque de diversões, declarando-os suspeitos.
Moradores da região, revoltados, incendiaram o parque. No dia seguinte (27/6), a polícia anunciou que os quatro confessaram ter estuprado e matado Tayná, mas não haviam conseguido explicar "onde está o corpo". Este só foi encontrado, por moradores da região, no dia 28, em um terreno baldio - e não enterrado como, segundo a polícia, disseram os acusados.

No dia 5 de julho, as autoridades consideraram encerrado o inquérito policial mesmo antes do resultado do exame de DNA nos vestígios de sêmen encontrados na roupa de Tayná. No dia 10 de julho, o resultado revelou que o sêmen encontrado não era de nenhum dos quatro suspeitos. Quatro dias depois, o caso voltava à estaca zero sobre como e quem havia assassinado Tayná, e até dúvidas sobre se ocorrera ou não estupro eram levantadas.

Quatorze pessoas, entre elas 9 policiais civis, um policial militar, um agente da guarda municipal, agentes penitenciários e até um preso "de confiança" foram acusados de tortura e tiveram mandados de prisão emitidos. Os quatro funcionários do parque disseram que foram espancados, empalados, asfixiados com sacos plásticos, eletrocutados, forçados a fazer sexo oral entre si e um deles relatou ter tido a cabeça enfiada num formigueiro.

Casos como este se repetem Brasil afora desde sempre. Como afirmou o representante da OAB do Paraná, em entrevista à Rede Globo, a polícia primeiro quer a confissão; depois, vai procurar provas que a justifiquem. Isso em nada se assemelha ao devido processo legal. E aí temos a clássica perversão: não investiga, não elucida ou, quando o faz, as provas são de baixa qualidade. Resultado: impunidade garantida. O Ministério Público não acolhe a denúncia ou o Judiciário não pronuncia os acusados. E a polícia responsabiliza o Ministério Público e o Judiciário por isso.

Desde 1997, a tortura está tipificada como crime. Diversas iniciativas foram adotadas pelo governo federal para eliminar a tortura. O Brasil recebe recomendações dos relatores especiais das Nações Unidas sobre o que deveríamos fazer para eliminar a tortura. Porém, a tortura continua e ocorre em todos os Estados brasileiros.

Impunidade se resolve com investigação, esclarecimento e identificação dos autores com provas - isto permite à justiça fazer a sua parte. Há décadas o país busca melhorar o desempenho de sua polícia: aumenta-se o efetivo, os salários melhoram (ainda que não satisfaçam as corporações), compram-se equipamentos, cursos, seminários, treinamentos no exterior, missões para conhecer polícias de diferentes países, etc. Porém problemas como o uso abusivo da força, tortura, corrupção e baixa taxa de esclarecimento dos delitos persistem. E continuam a ser considerados pelas chefias das polícias como problemas de alguns indivíduos. Não estaria na hora de serem interpretados como indicadores de problemas estruturais? Por que o interdito em se discutir a estrutura e forma de organização das nossas polícias?

Por exemplo: a existência de duas polícias aumenta a capacidade de esclarecer delitos e prevenir a ocorrência/recorrência dos mesmos? Qual é o custo em termos de desempenho das polícias, da estrutura organizacional que não permite a ascensão do policial que entra na carreira pelo policiamento de rua ao topo da mesma (seja na PM, seja na Polícia Civil)?

No caso específico da jovem Tayná, tivesse a polícia civil trabalhado em conjunto com a PM na busca da jovem e, em vez de pular imediatamente para a procura do suspeito, solicitado informações de pessoas que tivessem circulado pela região no dia e horário, batendo de casa em casa ou ainda realizado buscas nas áreas - como é feito em outros países -, não aumentaria a probabilidade de terem sido eles a encontrar o corpo? Isso teria garantido a preservação da cena do crime. Se não tivessem tornado pública a identidade dos quatro jovens que apreenderam no parque e torturaram fazendo-os confessar, o parque talvez não tivesse sido queimado. Quem vai pagar pelo prejuízo do dono? Então, se tivessem esperado pelo resultado dos exames de DNA antes de darem como concluído o inquérito policial, a credibilidade da polícia teria sido preservada.

Alguns desses procedimentos óbvios de investigação começaram a ser realizados apenas nos últimos dias, quase três semanas após o ocorrido, quando qualquer cidadão informado sabe que quanto mais tempo se passa, menor a probabilidade de se identificar o(s) responsável(eis).

E a tortura, que lição se tira dessa história? A julgar pelos casos estudados em São Paulo pela pesquisadora Gorete de Jesus, há pouca chance de que os policiais envolvidos, se chegarem a ser julgados, sejam punidos. A população de Colombo deverá permanecer intranquila e a confiança na polícia abalada por mais tempo, para o azar de todos nós.

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*NANCY CARDIA, Ph.D. EM PSICOLOGIA SOCIAL PELA LONDON SCHOOL OF ECONOMICS AND POLITICAL SCIENCES, É VICE-COORDENADORA DO NÚCLEO DE ESTUDOS DA VIOLÊNCIA (NEV-USP)

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Da direita à esquerda: fogo das ruas sacode a política institucional

A disputa continua: de onde vai sair a grana para a Tarifa Zero nos governos da direita? E os governos do PT e base aliada? Vão se mexer e promover logo a Tarifa Zero com ônus para os ricos?

por Simara Pereira e Victor Khaled 

Em 17 de julho, Edson Moura Junior (PMDB) anunciou a implementação da Tarifa Zero no sistema de transporte coletivo de Paulínia, a partir de 1º de outubro, sendo a primeira cidade da Região Metropolitana de Campinas a adotar a medida. A Prefeitura abolirá a tarifa, que custa um real, subsidiando integralmente o custo do sistema. É isso: Tarifa Zero, simples assim. Que venham vários a reboque.

A disputa continua: de onde vai sair a grana para a Tarifa Zero nos governos da direita? E os governos do PT e base aliada? Vão se mexer e promover logo a Tarifa Zero com ônus para os ricos? Seria a chance de mostrar que ainda têm elementos classistas? Será que nas cinzas da proposta de distribuição da renda urbana, defendida lá em 90, pelos idealizadores do projeto Tarifa Zero, restaram brasas, que, como diria Adoniran Barbosa, podem se “acender de novo”? Os críticos, minoritários no governo, com a comprovação de suas teses de décadas atrás, têm peso para superar a linha política da cúpula petista (que tantas vezes se mostrou mais reacionária que a própria direita)? Será que finalmente haverá respostas aos clamores de Maricato, Rolnik, Paul Singer, Chauí, entre outros intelectuais, que insistiram na reforma urbana e foram atropelados pela corrente majoritária? Todo mundo está "esperando", mas não parado! Aliás, se o governo estava esperando um sopro, veio um furacão logo, para não deixar dúvidas: a mobilidade está em crise, a Tarifa Zero é a solução e desejo popular, com ambição escancarada por uma vida sem catracas.

Continuamos nas ruas disputando cada centavo, para que o projeto Tarifa Zero não se transforme numa torrente de dinheiro público para os cofres de empresas de transporte privadas, sem qualquer fiscalização ou controle, como alguns pretendem. Como dissemos sempre, para abolir as catracas, o custo será dividido socialmente e cada um paga de acordo com suas possibilidades. Portanto, capitalistas que preparem os bolsos, pois precisam ter participação pesada nesse montante. Servirá para compensar, ao menos um pouco, o fato de terem expulsado da jornada de trabalho o tempo necessário ao deslocamento casa-trabalho, onerando o tempo livre do trabalhador com esse trajeto obrigatório à sua reprodução diária.

Nada de isenções! Nada de renúncia fiscal! Estado mínimo interessa aos liberais, que morreram todos, com suas defesas frágeis já superadas e enterradas, com aqueles gritos pavorosos de "Menos Impostos!" e "Menos Estado!". Se quem sustenta a arrecadação brasileira não são os grandes empresários, por que diabos acreditam ter direito a essas palavras de ordem? Essa é a hora em que o Estado capitalista tem que assumir sua responsabilidade. No dia em que não precisarmos mais de Estado, já teremos garantido a Tarifa Zero, expropriado a frota, terminais e os bens de produção privados, há muito tempo.

Quanto a Florianópolis, o poder público está atrasado. Os prefeitos Juniors, Brasil afora, já estão buscando soluções para viabilizar a Tarifa Zero, enquanto César ainda nem reduziu a tarifa. Não se sabe o que o prefeito Junior daqui está esperando. Com que empresários falta conversar? É muito ruim Florianópolis ficar por último. O Prefeito tem comprado um desgaste político para uma prefeitura recém-eleita.

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Simara Pereira, bancária, graduada no Curso de Ciências Econômicas da UFSC, militante do Movimento Passe Livre Florianópolis e da Frente de Luta pelo Transporte Público.
Victor Khaled, trabalhador do serviço público, graduando no Curso de Geografia da UFSC, militante do Movimento Passe Livre Florianópolis e da Frente de Luta pelo Transporte Público.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Projeto que cria Conselho de Direitos Humanos chega à Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina

Padre Pedro afirma que agora proposta será debatida em duas audiências regionais
Depois de uma articulação que envolveu movimentos de direitos humanos, parlamentares e o Governo do Estado, foi enviado à Assembleia Legislativa, no início da noite de terça-feira (16), o projeto de lei que institui o Conselho Estadual de Direitos Humanos de Santa Catarina (CEDH-SC). A proposta, que resgata uma dívida histórica do Estado com o setor, começou a ser construída em março, com um pedido oficial dirigido pelo deputado Padre Pedro Baldissera (PT), depois de solicitação dos movimentos que atuam na área, ao governador Raimundo Colombo.

“Solicitamos ao Estado a apresentação da proposta e fizemos uma sugestão de texto. Foi uma negociação produtiva, que agora vamos submeter à análise dos movimentos e da população”, explicou Padre Pedro, que também participou do processo de negociação com o Governo, junto da deputada Angela Albino (PC do B). 

O parlamentar analisou o texto e afirmou que o projeto passará por duas audiências públicas, em Lages, no dia 15 de agosto, e em Florianópolis, no dia 22 de agosto. O requerimento para a realização dos debates foi aprovado nesta quarta-feira (17), pela Comissão de Legislação Participativa. 

“É um avanço significativo para Santa Catarina. Isso abre a possibilidade de um órgão que será o guarda chuva de inúmeros projetos e políticas de garantias de direitos. Vamos agora ouvir as sugestões dos movimentos sociais do Estado, para aprimorar a proposta”, disse o deputado.

Atraso
Em 1998, Santa Catarina foi um dos estados pioneiros na criação de uma legislação prevendo o Conselho Estadual de Direitos Humanos (Lei n° 10.825, de 17 de julho de 1998). O texto foi aprovado em um projeto de iniciativa parlamentar, de autoria do então deputado Carlito Merss, que acabou promulgado pela presidência da Assembleia Legislativa em 1998, depois que o veto do então governador Esperidião Amin foi derrubado no Parlamento.

No entanto, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin n° 99.021235-1) proposta ao Tribunal de Justiça em razão de “vício de origem”, impediu que o Conselho fosse implantado.

Em março desse ano, depois de ouvir entidades ligadas ao movimento de direitos humanos, o deputado Padre Pedro apresentou ao governador Raimundo Colombo um pedido oficial para que o Estado encaminhasse a proposta, que chegou nesta terça-feira (16) ao Legislativo.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Prisões ilegais e violentas no "Catracaço" de 11/07 no TICEN, em Floripa

Companheir@s,
este vídeo mostra com clareza a ilegalidade e a violência das prisões de integrantes do movimento passe livre no TICEN, em 11 de julho, em Floripa.
O Movimento não deu causa à tamanha brutalidade da Polícia Militar de Santa Catarina... o que mostra a serviço de quem ela está... se presta à defesa dos Empresários do Transporte e não à população. 
Salienta-se que o suposto "dano" já havia sido reparado quando a manifestação saiu do TICEN. 
Nossas manifestações clamam pela NÃO-VIOLÊNCIA, tanto que uma das palavras de ordem é "SEM VIOLÊNCIA!", e ontem não foi diferente! 


#mpl #tarifazeto #porumavidasemcatracas