terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Segurança Pública e Violência Institucional: a “crise do modelo de segurança pública” e as propostas do movimento de direitos humanos

Recebido pelo Grupo da Confederação do Equador - postado por Eduardo Fernandes, em 27/02/2011.
Vale a Leitura!
Abraços,
Daniela Felix
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Por Rafael Dias e Sandra Carvalho

A segurança pública e a violência institucional é uma área de atuação privilegiada no trabalho cotidiano de pesquisa, documentação e promoção dos direitos humanos da Justiça Global em diversos estados do Brasil. Nos últimos anos, realizamos nossos posicionamentos políticos através de inúmeras notas públicas, informes, relatórios e publicações sobre o tema. Entre eles podemos destacar o Relatório Rio – Violência policial e Insegurança pública (2004); Segurança, Tráfico e Milícias no Rio de Janeiro (2008); Criminalização da pobreza – Um relatório sobre as causas econômicas, sociais e culturais da tortura e outras formas de violência no Brasil (2009) e a Cartilha popular do Santa Marta: Abordagem policial (2010). Também participamos da construção do Encontro Por outra Segurança Pública (ENPOSP), que aconteceu paralelamente a realização da Conferência Nacional de Segurança Pública (CONSEG).
Esse conjunto de ações políticas e publicações demonstram que a Justiça Global e outras organizações de direitos humanos não se esqueceram desse tema e têm se posicionado publicamente sobre as políticas de segurança pública vigentes no país, visando criar uma consistente política pública de segurança. Apesar da mobilização de atores sociais por uma reforma abrangente na área, pouca coisa mudou no cenário brasileiro. A proposta do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), com integração nacional e valorização do profissional, foi derrotada no início do primeiro governo Lula. Já o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), alardeado como novidade no final do segundo mandato, não resistiu e está à míngua no atual governo Dilma. Ou seja, as duas principais políticas para o setor foram sistematicamente desmontadas. Parece que existe um forte lobby que busca deixar tudo do jeito que está. Pior para a sociedade e para os direitos humanos.
As recentes reivindicações salariais, através de ações grevistas (funcionando como pressão pela aprovação da PEC 300) de policiais militares e bombeiros em diversos estados do país, demonstram que algo não anda bem na segurança pública brasileira. Para além da reivindicação salarial e valorização do trabalho, existem elementos nessa “crise da segurança pública” que apontam para um esgotamento do modelo em curso, que é hierarquizado, disfuncional e foi consolidado no período da ditadura civil-militar (1964-1985).
No modelo atual temos duas polícias que funcionam com o ciclo incompleto. Isso quer dizer, resumidamente, que a Polícia Militar atua no policiamento ostensivo (reativo) de acordo com ocorrências aleatórias. Já a Polícia Civil (judiciária) realiza a segunda parte do ciclo, que é a investigação criminal, e apresenta os fatos e o conjunto de provas para que o Ministério Público denuncie ou arquive e depois a justiça comum julgue. Dessa forma, a Polícia Civil integra o sistema de justiça criminal. Essa dicotomia entre as polícias produz concorrência entre elas e preserva um arranjo político pouco eficaz.
Certo é que o problema na área de segurança pública tem sido negligenciado por sucessivos governos, e agora ele dá sinais que o organismo já não consegue viver harmonicamente com os arranjos institucionais que se amontoaram. Temos uma polícia violenta, responsável por cerca de 1/5 dos homicídios nacionais e que está envolvida com grupos de extermínio. Outro dado assustador é a crescente participação de agentes públicos em grupos armados que fazem controle econômico de territórios, conhecidos popularmente como milícias. Do ponto de vista institucional, vemos uma forte hierarquização na Polícia Militar e no Corpo de Bombeiros que não lembra em nada as funções civis da segurança pública. Esse formato cria instituições pouco propensas à democracia interna e externa e que tratam os movimentos sociais e defensores de direitos humanos como inimigos a serem combatidos. Estamos falando, precisamente, do processo de militarização da segurança pública e da sociedade em que o BOPE é o paradigma máximo.
A pauta da desmilitarização da segurança pública e a reforma profunda da atividade policial foram sistematicamente boicotadas por esse governo e os anteriores em nome da continuidade de um modelo, que apesar de aberrante, tinha se cristalizado como natural e inamovível. As manifestações das organizações da sociedade civil, que detectavam os graves problemas sociais e as violações de direitos humanos perpetuadas, não ganharam eco no aparelho de Estado, apesar do extermínio em curso da juventude negra do país.
Seguimos com uma institucionalidade na PM que não responde às demandas atuais por segurança pública e está conformada para manter os policiais e a própria sociedade sob controle. A utilização do código militar e o impedimento de sindicalização dos policiais militares em organização de caráter civil é a mostra da força das ideias que estão insistentemente fora de lugar. No período de democratização permaneceu e se consolidou um formato do regime ditatorial. O efeito disso é que os policiais militares (pouco afeitos com as atividades civis) a título de greve fazem, por vezes, aquilo que aprenderam nas casernas. Colocam-se pelo poder das armas acima dos interesses da sociedade, como se viu há pouco no movimento paredista da Bahia.
Por tudo isso, é possível afirmar que a atual crise na segurança pública não é novidade para nenhum governo, mas somente uma fase aguda da doença crônica. A questão a ser respondida é: como desmontar essa monstruosidade que quer se perpetuar? A atual crise não acaba com as greves debeladas, ela somente é postergada para um futuro próximo, quando a sua eclosão pode ter contornos ainda mais dramáticos do que aqueles vistos no verão de 2012. Assim, um primeiro passo seria levar a sério as propostas feitas pelas organizações da sociedade civil sobre o tema e que estão presentes no Programa Nacional de Direitos Humanos 3 (PNDH-3). Vamos listar algumas só para aquecer o debate e lembrar aos que querem esquecer esse tema inconveniente:

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

[Divulgação] II Seminário Direito, Pesquisa e Movimentos Sociais e fundação do Instituto de Pesquisa, Direito e Movimentos Sociais (IPDMS)

Carta Convite para o
II Seminário Direito, Pesquisa e Movimentos Sociais e fundação do Instituto de Pesquisa, Direito e Movimentos Sociais (IPDMS)

Aos Trabalhadores da Educação, da Ciência e do Pensamento Livres,
À Classe Trabalhadora, e
Aos Lutadores do Povo brasileiro,

Nós, professores, professoras, pesquisadores, pesquisadoras, militantes, profissionais e estudantes, conscientes da necessidade de construirmos uma práxis crítica sobre novos horizontes utópicos, decidimos pelo apoio aos movimentos populares brasileiros. Para tanto, pesquisa e ação devem se reencontrar e superar os escombros da crítica jurídica nacional.
A formação do Povo brasileiro se deu em um processo histórico complexo e violento, com um ajuntamento de povos que aqui já viviam e que aqui passaram a viver, dando vez a uma nova e mestiça realidade social. Tal processo recebeu a marca do etnocídio embasado no etnocentrismo, no eurocentrismo e no heleno-romanocentrismo, que abateu, especialmente, índios e negros. Daí que se faz necessária a crítica à colonialidade, por uma América Latina e por um outro mundo pluricultural, feita com as gentes da terra, outrora desterrados, e das margens dos campos e das cidades, ainda hoje condenados e famélicos.
Nossas disputas buscam conformar a contra-hegemonia e incluímos em nossa crítica os cortes estruturais à sociedade brasileira: classe, raça e gênero. Combatemos a dependência e a colonialidade. Nossas dimensões da crítica jurídica são o uso combativo do direito posto, a releitura deste mesmo direito, a insurgência – pelo Direito Insurgente ou Novo Direito -, o antinormativismo e o novo. Somos pela libertação das opressões de todas as espécies e nosso horizonte é irredento tanto no que se refere a estrutura do mundo em que vivemos quanto às idéias que o hegemonizam.
A insurgência contém o trabalho como fonte da produção de nossa existência, a resistência dentro desta mesma existência, a educação popular para a conscientização, junto da organização dos movimentos populares, vale dizer, os movimentos sociais que reúnem em seu seio a dialética reivindicação-contestação, a partir de pautas identitárias unidas à materialidade do trabalho e à concepção de totalidade da condição humana.
Contribuímos e queremos potencializar nosso apoio às assessorias populares: a jurídica, a política e a de formação. Nossos princípios são a pesquisa-ação, a educação popular, o trabalho coletivo e o protagonismo estudantil e dos movimentos sociais
Assim, noticiamos, por meio desta Carta - que é notícia e é convite: a realização do II Seminário Direito, Pesquisa e Movimentos Sociais e a fundação do Instituto de Pesquisa, Direito e Movimentos Sociais.

Todos estão chamados e convidados para assinar esta convocação e para participar do II Seminário Direito, Pesquisa e Movimentos Sociais, e da assembléia de fundação do Instituto de Pesquisa, Direito e Movimentos Sociais, que será realizado na Universidade Federal de Goiás – UFG, Campus Cidade de Goiás/GO, nos dias 26, 27 e 28 de abril de 2012.
Informações podem ser obtidas via endereço eletrônico:  ipdmscorreio@gmail.com

Assinam esta carta, até o presente momento:
Antonio Escrivão Filho, advogado - DF.
Carolina Alves Vestena, professora - UERJ.
Danilo Uler, advogado - SP.
Fabiana Severi, professora - USP FDRP.
Giane Álvares Ambrósio Álvares - Advogada
João Paulo Medeiros, estudante - UFRN.
Jose Carlos Moreira da Sila Filho – PUC/RS
José do Carmo A. Siqueira, professor - UFGO.
José Ricardo Cunha - UERJ
Luiz Otávio Ribas, professor - PR.
Marcus Orione, professor - USP.
Ney Strozake, advogado - SP.
Priscylla Joca, professora e pesquisadora - UFCE.
Priscilla Mello, estudante - UFRJ.
Ricardo Prestes Pazello, professor - UFPR.
Rosane M. Reis Lavigne, defensora pública - RJ.