sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Ataques em SP: Imobilismo, corrupção e omissão do Estado


Muito boa entrevista e ótimo material disponibilizado pra pesquisa!

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Crime organizado cresce sob o imobilismo estatal, diz pesquisadora da Justiça Global

O componente corrupção, organização do crime por dentro do estado, tem que ser mais seriamente investigada. No nosso entendimento tem um componente econômico que é muito importante na deflagração dessa onda de violência"


Por Aray P Nabuco
Caros Amigos

Imobilismo do Estado, omissão em investigar e punir e corrupção dentro e fora das estruturas do poder público são os ingredientes que mantêm São Paulo refém de ataques do crime organizado, grupos de extermínio e revides extra-judiciais. Com períodos mais intensos, como o vivido atualmente, desde maio de 2006 o embate entre o Primeiro Comando da Capital (PCC), grupos de extermínio e forças de segurança nunca parou de fato, diz a pesquisadora e co-fundadora da organização não-governamental Justiça Global, Sandra Carvalho. Junto com outros pesquisadores, Sandra é autora do mais completo estudo das causas dos ataques de maio de 2006, intitulado "São Paulo sob Achaque", baseado em pesquisa de 5 anos em documentos oficiais, inquéritos e entrevistas com autoridades policiais - o 'achaque' no título, faz referência direta à corrupção.

Previsível
Ao constatarem que as mesmas condições que detonaram os ataques de 2006 - corrupção, omissão, ausência de investigação e punição - continuavam existindo em São Paulo, os pesquisadores não titubearam em vaticinar, ainda no fim de 2010, que o Estado sofreria novos ataques. E acertaram - já são quase 100 policiais mortos e muitas chacinas nas periferias com mais de 200 assassinatos, o que levou o governador Geraldo Alckmin a derrubar seu secretário de Segurança Pública e substituí-lo e a aceitar ajuda do governo federal.
Em entrevista à Caros Amigos, Sandra aborda as constatações da pesquisa, os ataques atuais e sua relação com a ineficiência e corrupção no Estado. Para ler "São Paulo sob Achaque", clique aqui . 

Caros Amigos - Há uma omissão do Estado em tentar resolver esse problema?
Sandra Carvalho - O que a gente verificou na pesquisa é que as principais questões que estavam envolvidas no que se costumou chamar de Crimes de Maio não foram investigadas, não foram analisadas e não tiveram uma resposta adequada por parte do Estado. O trabalho chama "São Paulo sobre Achaque", houve até uma discussão do porque esse nome 'achaque', porque a palavra não é muito utilizada, mas é usada na polícia e fazia todo sentido com base no que a gente investigou, que é uma relação do crime organizado dentro e fora do Estado, de setores que estão dentro (das estruturas) do estado, mas que estão realizando atividades criminosas, com setores que são crime organizado por fora do estado. Há uma relação econômica, digamos assim, mas nunca foi investigada adequadamente.
Não houve essa resposta, não houve um enfrentamento de todo um setor que estava envolvido com corrupção dentro e fora do estado e que motivou muito dessas ações violentas, tanto por parte do crime, quanto por parte de setores do estado.
CA - Vocês citam a corrupção de policiais. O quanto da corrupção do poder público explica os ataques?
SC - Eu não sei quantificar, mas o que a gente pesquisou é que em maio de 2006, situações muito emblemáticas, como foi o sequestro do enteado do Marcola (líder do PCC na época), e depois a lista das transferências das lideranças, foram fundamentais para deflagrar os ataques do PCC e depois o revide da polícia.
Agora, algumas informações que venham por parte da polícia e que já foram dadas visibilidade pelos meios de comunicação, apontam que talvez isso também tenha acontecido. Eles falam da venda de uma lista ao PCC com nomes de policiais, enfim.
A gente viu também que tinham muitos policiais, principalmente civis, sendo investigados pela Corregedoria. E essas investigações nunca chegaram a termo, não resultaram em investigação isenta, séria. O componente corrupção, organização do crime por dentro do estado, tem que ser mais seriamente investigada. No nosso entendimento tem um componente econômico que é muito importante na deflagração dessa onda de violência, seja na ação das chacinas ou de grupos de extermínio, em grande parte integrados por policiais. Me lembro que na pesquisa, o então delegado geral, Desgualdo (Marco Antonio Desgualdo), quando indagado pela gente sobre quem eram os encapuzados, ele na entrevista à nossa equipe, falou "Eram PMs". Eram PMs, mas de lá para cá não teve uma investigação, uma apuração, não foram desmanteladas essas organizações criminosas, nem dentro do estado, nem de fora.
A gente falava que era importante uma investigação que envolvesse o Ministério Público Federal, a Polícia Federal. A gente recomendou, na verdade, a federalização dos crimes, para que não ficassem sendo investigado pela própria polícia paulista. Nós, em parceria com a Defensoria Pública de São Paulo e o movimento Mães de Maio, ingressamos com um pedido de deslocamento de competência para que as investigações passassem para a esfera federal.
CA - Mas isso também nunca ocorreu.
SC - Nós nunca tivemos um retorno da Procuradoria Geral da República, uma manifestação no sentido de que esse pedido avançasse e fosse encaminhado para o STF. Também foi formada uma comissão especial na polícia para investigar os crimes de maio, que infelizmente também não foi pra frente. O que a gente pôde acompanhar - nós integramos essa comissão especial, e temos conversado, dialogado sistematicamente com o grupo Mães de Maio -, é que também de maio de 2006 até agora, a gente teve momentos em que essa violência se intensifica. Mas se a gente olha para a Baixada Santista, por exemplo, a gente vê uma continuidade da ação de grupos de extermínio, das chacinas, com um perfil muito parecido com o que a gente identificou em maio de 2006.
Agora, a imprensa reforça algumas notícias de que algumas das vítimas tiveram a sua identidade, sua ficha criminal checada antes de serem assassinadas. O nosso relatório também mostra que isso aconteceu nas mortes de maio de 2006.
CA - Já era uma prática?
SC - Sim, já era uma prática. E há a proximidade entre a morte de um agente do estado com uma chacina que acontece logo em seguida. Assim, o que a gente vislumbra hoje é que realmente verifica-se algo muito parecido com maio e 2006.
CA - Quer dizer, o que está ocorrendo hoje é só uma continuação?
SC - Claro, porque não houve um enfrentamento adequado e à altura do que aconteceu naquele momento em 2006.
CA - Dá pra dizer que o Estado está em um imobilismo em relação a esse assunto?
SC - Sim, está num imobilismo e omisso porque esse relatório, por exemplo, foi entregue às autoridades públicas de São Paulo. Traz várias questões que deveriam ter uma análise mais aprofundada. A gente fez, por exemplo, um estudo de diversos casos registrados como "resistência", de como na verdade foram execuções. E não houve nenhuma movimentação por parte do poder público de São Paulo, do Ministério Público e mesmo do Judiciário de reabertura de muitos desses casos, de uma investigação mais exaustiva.
CA - No estudo, vocês fazem várias recomendações. Alguma delas foi realizada?
SC - Nos termos do que são as recomendações que a gente fez, muito pouco delas foi realizado. Uma das questões eram os mutirões carcerários, mas o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) teve muita dificuldade de realizar os mutirões, muita resistência do Estado, do próprio TJ de São Paulo (Tribunal de Justiça de São Paulo). E não foi feita de forma satisfatória, foram verificados vários problemas.
A gente falava também que seria super importante a instalação de uma comissão parlamentar mista de inquérito para apurar exaustivamente essa situação. Isso também não foi realizado, infelizmente. Também não foi feita uma revisão integral do trabalho de investigação, tanto da polícia, quanto também do próprio Ministério Público. Porque muitos inquéritos foram arquivados numa brevidade muito grande, inquéritos extremamente frágeis. E o MP jamais poderia ter concordado que investigações tão inócuas, tão incipientes fossem arquivados com tanta brevidade. Então, a gente recomendava que o Conselho Nacional do Ministério Público realizasse uma revisão integral da ação do próprio MP paulista nesses casos. Essa ação também não foi feita e no nosso entendimento também era importante de ser feito.
No estudo, a gente mostra como tudo foi conduzido para que não houvesse uma investigação. A ocultação das provas, por exemplo, no caso dos encapuzados, das chacinas. Os encapuzados chegavam, matavam e imediatamente na sequência chegava uma viatura da polícia, que recolhia o corpo e muitas das vezes as cápsulas, os projéteis que tinham sido disparados; nos inquéritos, só os policiais eram ouvidos, as testemunhas não foram ouvidas. Então, tudo o que é uma prática para a construção de um inquérito policial consistente, foi absolutamente desprezado.
Pelo que a gente está vendo novamente, essa mesma prática tem acontecido. Na investigação do que acontece hoje, em 2012, não houve uma modificação na prática de como essas investigações são feitas e muito provavelmente a gente vai ter resultado de não-investigação, de resultados insatisfatórios como a gente viu em maio de 2006.
É necessário um enfrentamento muito mais contundente, uma investigação mais rigorosa e externa, que se investigue a relação promíscua entre o crime organizado dentro e fora (das estruturas) do estado para que a gente não veja a repetição desses episódios.
CA - Vocês chegam a citar envolvimento de políticos. Vocês aprofundaram essa investigação?
SC - A gente não aprofundou, a gente fala que chegou a indícios e por isso a gente recomendava investigação. Nos chama atenção que várias crises envolvendo o sistema prisional, a começar pelo próprio Massacre do Cararndiru lá atrás, acontece em períodos eleitorais. A gente está saindo de um período eleitoral agora; em maio de 2006 a gente também estava em um processo eleitoral. As movimentações que acontecem dentro de um período eleitoral nos mostraram que deveriam ser investigadas a fundo.
Muitas relações envolvendo parlamentares, políticos, algumas movimentações nos trouxeram indícios, mas não houve tempo de fazer uma investigação rigorosa nesse sentido.
CA - Mas é possível afirmar que o PCC tem uma ideologia política e quer influir nos processos políticos?
SC - Eu não tenho elementos para dizer isso. Mas uma das suposições que a gente tem, é que o PCC talvez tenha até abandonado essa vontade que ele tinha - já tiveram denúncias na imprensa - de ter candidatos.
Mas mais do que isso, quero deixar bem claro, de forma muito incipiente, nos parece que esses momentos eleitorais são muito propícios para negociações, acordos, transações econômicas. Eu diria mais por aí. Por isso que a gente recomendou investigações mais rigorosas.
CA - Forçar uma situação de acordo, de conversa.
SC - Exatamente. Para com setores do crime organizado dentro do estado.
CA - Vocês chegaram a detectar relações permanentes do PCC com outras facções fora do Estado de São Paulo?
SC - Não. As nossas investigações apontam através de entrevistas que foram feitas, e mesmo pela documentação produzida pelos órgãos de imprensa, que dentro do sistema prisional de alguns estados via-se movimentação de filiados do PCC. Mas a gente não investigou a ação do PCC em outros estados. Isso ocorre, inclusive, pelas próprias transferências após rebeliões, enfim. Então, a gente identificou que tinham integrantes do PCC esparramados por presídios de outros estados.
CA - Essas facções, como o PCC, parecem um fenômeno de São Paulo e Rio de Janeiro...
SC -
 Mas é diferente. Sou de São Paulo, há 20 anos acompanho a situação prisional de São Paulo e há 7 anos no Rio de Janeiro. Vejo diferenças de como o crime se organiza dentro e fora do sistema prisional em São Paulo e Rio de Janeiro. Até porque, em São Paulo, a gente tem a predominância de uma facção e no Rio, tem mais facções coexistindo.
CA - Mas é um fenômeno que ocorre em outros estados?
SC - Vários estados têm facções. Vários têm o crime organizado dentro das estruturas do estado. Se a gente olha no Espírito Santo, por exemplo, é um estado que viveu situações do crime organizado, de ação de grupos de extermínio, do crime envolvendo esferas do poder público no Legislativo, no Judiciário, na polícia, dentro do sistema prisional. Então, assim, é um fenômeno que acontece também em outros estados, mas guardando as diferenças e características de como se organiza.
CA - Eu pergunto isso porque tem uma sensação da população de que o crime organizado é generalizado, no Brasil todo. É possível afirmar que o crime organizado se tornou um problema em todos os estados?
SC - Tem várias caracterizações para crime organizado. A gente tem que diferenciar o que é uma situação de violência do que é crime realmente organizado. Na situação de São Paulo, como é também um pouco a situação do Rio e é também do Espírito Santo, essa relação do crime que se organiza por dentro do estado é muito forte.
Se a gente pensa o Rio de Janeiro, por exemplo, onde o chefe da Polícia Civil foi preso, a cúpula foi desmontada por conta de seu envolvimento com o crime organizado, você tem essa relação mais direta com agentes do estado - o Álvaro Lins com a coisa dos jogos de azar, do jogo do bicho. No Espírito Santo também.

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quinta-feira, 29 de novembro de 2012

AJD/SC LANÇA NOTA PÚBLICA SOBRE A SEGURANÇA PÚBLICA E SISTEMA PRISIONAL CATARINENSE

Para conhecimento e divulgação.

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A AJD/SC - ASSOCIAÇÃO JUÍZES PARA A DEMOCRACIA, núcleo de Santa Catarina, entidade não governamental, sem fins corporativos, que tem dentre seus objetivos estatutários o respeito absoluto e incondicional aos valores próprios do Estado Democrático de Direito e a defesa dos Direitos Humanos, tendo em vista a grave situação por que passa a segurança pública do Estado, acentuada pelos ataques a ônibus, viaturas, bases policiais e unidades prisionais, amplamente divulgado em rede nacional, vem a público manifestar o seguinte:
1. O estado para-legal nasce onde o estado legal falta.
2. A paz social passa obrigatoriamente pelo respeito aos direitos fundamentais de toda a população, inclusive das pessoas presas (art.5º, da CF), respeito esse fonte legitimadora das instituições públicas;
3. Nos últimos dez anos a população carcerária catarinense cresceu em escala geométrica. Porém o sistema prisional não recebeu investimento proporcional, sendo sucateado, sofrendo com prédios em ruínas, com a falta de salubridade para os presos, no atendimento mínimo da sua saúde e na ausência de oferta de trabalho e estudo, entre tantas outras omissões. Além disso, há falta de agentes penitenciários devidamente valorizados e treinados, aptos a exercer suas importantes atividades com segurança e responsabilidade. Ou seja, as unidades prisionais de Santa Catarina restam comparáveis às da idade média, sem as mínimas condições de cumprimento da pena que a lei e o padrão de civilidade arduamente conquistados exigem.
4. Por outro lado, a Secretaria de Justiça e Cidadania não tem se mostrado capaz de enfrentar a situação e apontar políticas de estado concretas para a problemática, sequer indicando com clareza quais os planos de ação e projetos efetivos que pretende implantar para as urgentes melhorias do sistema prisional.
5. O reflexo, como se viu, é o descontrole do sistema e a violência se apresentando em toda sua crueldade, dentro e fora do cárcere.
Portanto, é preciso que o Estado compareça nas unidades prisionais, com política sólida de investimentos, em respeito absoluto ao fundamento da dignidade da pessoa humana e em última análise em respeito ao povo catarinense.
Ângela Konrath – Juíza do Trabalho - Coordenadora do Núcleo da AJD/SC

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO PENAL E CRIMINOLOGIA

Começa amanhã, 29/11/12, em Curitiba/PR!!!
Abaixo a programação:
Data: 29 de novembro a 1º de dezembro de 2012

Inscrições até 28/11/2012

Local: Pleno | 12º andar do Edifício Anexo - TJPR

Investimento: R$ 100,00 (profissional) e R$ 50,00 (estudante).

Agenda:
29 de novembro - 19h às 22h
30 de novembro - 09h às 12h e 15h às 22h
01 de dezembro - 10h às 13h

terça-feira, 20 de novembro de 2012

XXVII SEMANA DA TERRA EUGÊNIO LYRA - XVI ENCONTRO DA RENAP





XXVII SEMANA DA TERRA EUGÊNIO LYRA
XVI ENCONTRO DA RENAP
Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares

SALVADOR, BAHIA
21 A 25 DE NOVEMBRO DE 2012
 LOCAL: CTL – Centro de Treinamento de Líderes – Praia de Itapuã


21/11 – QUARTA-FEIRA

12h – Acolhida
16h – Reunião dos articuladores. Definições e ajustes para o encontro.
18h – Jantar
19h – Abertura. Apresentação dos trabalhos e participantes.
19:30h – Conjuntura. Avanços e retrocessos nos direitos conquistados no Brasil

.Maria José Pacheco (CPP-BA);
.Ruben Siqueira (CPT-BA);
.Leomárcio Silva (Coordenador Estadual do MPA);


22/11 – QUINTA-FEIRA

9h – Mesa: Advocacia Popular, Movimentos Sociais e Sistema de Justiça.

 .Cacique Babau (Povo Tupinambá da Serra do Padeiro/BA)
.Gerivaldo Neiva (Juiz de Direito – AJD e AATR/BA).
.Mariana Trotta (Mariana Crioula e JusDH/RJ)
. Amélia Rocha (Defensora Pública - Comissão de Direitos Humanos do CONDEGE/CE).

10:20h – Debate.
12h – Almoço
 14h – Oficinas, Grupos de Trabalho e Reuniões. Temas sugeridos:

- INICIATIVAS DO EXECUTIVO, LEGISLATIVO E JUDICIÁRIO DE IMPACTO NOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS E MOVIMENTOS SOCIAIS (CODIGO FLORESTAL, PEC 215, CONVENÇÃO 169, PORTARIA 303, ADI 3238).
- DEMOCRATIZAÇÃO DA JUSTIÇA (JUSDH, TRIBUNAL POPULAR DO JUDICIÁRIO, TRIBUNAL DA TERRA, INCIDÊNCIA NO STF).
- INICIATIVAS DE DEFESA DE TERRITÓRIOS DE POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS (TERRITÓRIOS PESQUEIROS E PEC DOS FUNDOS DE PASTO).
- ENFRENTAMENTO JURÍDICO DE MEGAEMPREENDIMENTOS.
- CRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO
- NOVA CARTOGRAFIA SOCIAL

18h – Jantar
19h - Mesa: Novos códigos e o conservadorismo de impacto na advocacia popular. Os casos do Código Penal, Código de Processo Civil e Código Florestal.

. João Alfredo Telles Melo (Professor, advogado/CE);
. Católicas pelo Direito de Decidir – CDD/ Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher - CLADEM;
. Julia Ávila (Terra de Direitos/PR);
. Gabriel Sampaio (Secretaria de Assuntos Legislativos – Min. da Justiça).

20:00h – Debate

23/11 – SEXTA-FEIRA

9h - Mesa Redonda: Educação Jurídica e Advocacia Popular

. Maurício Azevedo (UFBA/UNEB/AATR-BA)
.Maria José Andrade de Souza (Núcleo de Extensão da UEFS/BA)
.Stella Rodrigues (UNEB/BA)

10:20h – Debate

12h Almoço
14h – Oficinas, Grupos de Trabalho e Reuniões. Temas sugeridos:

- DIREITO À EDUCAÇÃO NO CAMPO E AS TURMAS ESPECIAIS DO PRONERA
- PAPEL DO IPDMS E ARTICULAÇÃO NACIONAL.
- ASSESSORIA JURÍDICA UNIVERSITÁRIA, NUCLEOS ETC.
- INICIATIVAS DE EDUCAÇÃO JURÍDICA POPULAR.
- PAPEL DA MULHER NA EDUCAÇÃO JURÍDICA POPULAR.
- CONSTRUÇÃO DO RELATÓRIO DE VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS NO NORDESTE

18h – Jantar
19h - Mesa: Memória e Verdade - a luta contra a ditadura civil-militar ontem e hoje

. Dr. Inácio Gomes (advogado de presos políticos na ditadura/BA);
. José Carlos Zanetti (CESE/BA);
. Diva Santana (Tortura Nunca Mais/BA);

20:30 h – Atividade Cultural

24/11 – SÁBADO

9h – Roda de diálogo: o papel da RENAP e entidades de assessoria jurídica popular na atual conjuntura.

. Noaldo Meireles (Dignitatis/PB);
. Antonio Sérgio Escrivão (jusDH e Terra de Direitos);
. Coletivo de Mulheres da RENAP;
. AATR/BA

10:20h – Debate
12h – Almoço
14 h - Plenária e encaminhamentos.
18h - Jantar
19 h – Comemoração de 30 anos da AATR, 10 anos da Dignitatis, 10 anos da Terra de Direitos, 17 anos da RENAP, 05 anos da Mariana Crioula, 08 anos do Cerrado.
Festa de encerramento.

25/11 – DOMINGO
Dia livre, despedidas e retornos...

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Os fatos em Florianópolis, por Elaine Tavares

Excelente reflexão feita pela Companheira de lutas Elaine Tavares (Blog Palavras Insurgentes - http://eteia.blogspot.com.br/).
Vale a Leitura!



Dizia Maquiavel ao seu soberano no célebre livro O Príncipe, ensinando como administrar um estado. “Conhecendo-se de longe os males que virão (o que só é dado ao homem prudente), pode-se curá-los facilmente. Mas, quando esses males se avolumam de modo que todos já podem reconhecê-los, não há mais remédio que possa estancá-los”. Pois é essa baratontice (de não saber entender a realidade) que se pode observar nas declarações do governador Raimundo Colombo, nos secretários municipais, no alto comando da polícia e tantas outras autoridades, nesses dias em que, ao que parece, baixou um zepelim dourado na cidade de Florianópolis. A tal da “segurança” do estado de direito parece ter se esvaído e ninguém sabe onde encontrá-la, com as autoridades preferindo atuar na aparência a mergulhar na essência dos problemas, para definitivamente resolvê-los. Talvez, como na música do Chico, estejam esperando uma Geni, que afaste o mal, por hora, para que os turistas possam voltar e a cidade se sentir segura.

Na verdade, poucos conseguem perceber que a raiz dessa violência desenfreada está na própria existência de um sistema de organização da vida que divide as pessoas em classes, sendo que uma é possuidora dos meios de produção e das riquezas produzidas, e a outra, nada tem além do corpo, a força de trabalho. Ao mesmo tempo, a classe que domina impõe uma pedagogia do desejo que faz com que os que nada têm almejem possuir o que nunca terão. Assim, quando essa expectativa se frustra, as respostas são as mais diferentes: uns, se resignam, outros, lutam, outros tomam à força o que o próprio sistema lhes ensina querer. Esses, os últimos, por fazerem o que fazem, são perseguidos e punidos. E daí nasce o paradoxo do sistema prisional. Grande parte dos que ali estão nada mais é do que vítima de um sistema que lhes ensina a querer o que nunca terão, mas que, por rebeldia ou necessidade, acabam por tomar na força. O estado, criador do sistema punitivo, não tem qualquer compromisso com essas gentes. Não quer cuidar delas, não quer recuperá-las, não se importa. Trata como um tumor, uma doença que foi crescendo no corpo sarado que tenta dar ao sistema social, e cujo destino final só pode ser o extermínio.

Ao que se sabe as prisões sempre existiram como espaço de confinamento daqueles que burlassem a paz dos senhores. Os que não pagassem os tributos, os que se rebelassem contra o poder, os chamados hereges. Nos tempos mais antigos o confinamento não tinha o caráter de pena, o que se buscava era manter a pessoa sob o domínio físico, visando garantir que os castigos fossem impostos. Conforme conta Elizabeth Misciasci, no trabalho “Como nasceram os cárceres”, até a chamada modernidade ninguém se importava muito com os locais onde as pessoas eram aprisionadas exatamente por não estares ligados a uma pena. Eram só os espaços nos quais a pessoa esperava pela tortura ou pela execução. As penas, conta ela, eram imputadas conforme o arbítrio dos governantes, que as definiam conforme o "status" social do réu: “amputação dos braços, degolar, a forca, incendiar, a roda e a guilhotina, proporcionando o espetáculo e a dor, como por exemplo, a que o condenado era arrastado, seu ventre aberto, as entranhas arrancadas às pressas para que tivesse tempo de vê-las sendo lançadas ao fogo. Eram essas penas que constituíam o espetáculo favorito das multidões deste período histórico”.

A ideia de prisão como espaço de cumprimento de pena só vai começar com o advento do capitalismo, pois como explica Misciaci, só num sistema em que o trabalho humano é medido pelo tempo poderia vingar a proposta de se fazer expiar o delito com um “quantum de liberdade”. Da mesma forma, na Europa, durante o período da chamada revolução industrial, a pobreza das gentes atingiu índices estratosféricos e desde aí, a criminalidade também aumentou. Foi essa situação específica que gerou a construção de lugares específico onde as pessoas pudessem ficar confinadas para corrigir sua forma de agir no mundo. Naqueles dias era crime mendigar, vagabundear, e não aceitar trabalho. As prostitutas eram consideradas “criminosas natas”. O preso era um sujeito sem direitos, não importando qual fosse seu delito. E foi apenas no século 18 que surgiu o Direito Penitenciário como uma tentativa de garantir ao prisioneiro uma proteção. A base era a exigência ética de que um ser humano deve ser tratado com dignidade seja qual for o seu delito, e que a um ato violento não se deveria pagar com outro.

Todo esse movimento da sociedade em direção a garantia de direitos dos apenados nunca foi sem razão. Ao observar a história das prisões fica bastante claro que boa parte das pessoas que eram encarceradas estava mais para vítima do que vilã. E isso quase sempre foi assim. É fato que existem criminosos violentos e cruéis, mas no mais das vezes a maioria dos que estão nas prisões cumprem pena por delitos leves.

No Brasil, o chamado regime penitenciário, de caráter correcional, com fins de ressocializar e reeducar o detento, só apareceu em 1890, depois reforçado e resignificado com diversas outras leis. E, como é comum nos países que ficam na periferia do capital, por aqui a pobreza sempre foi gigante, criando as condições para que a criminalidade se fizesse em igual dimensão. Num mundo onde a riqueza fica nas mãos de poucos, muitos são os que se rebelam contra essa concentração, daí a necessidade que os detentores da propriedade têm de contínua vigilância de seus bens. Para isso criam forças de repressão e sistemas de reclusão para quem burla as leis, as quais, majoritariamente, foram feitas pela classe dominante. Logo, para servi-la.

O fato é que a tal da ressocialização dos presos nunca foi real. As prisões serviram e continuam servindo apenas como depósito de gente “malvada”, vista como câncer da sociedade. Assim o que acontece com eles dentro dos portões das penitenciárias não importa a ninguém. Para a maioria que vive mansamente sob as regras ditadas pela minoria, existe até uma sensação de segurança. Se os “malvados” estão presos, tudo correrá bem. É por isso que as denúncias de superlotação, espancamentos, violências, violação de direitos humanos, são vistas como coisas absurdas. Ou seja, não é permitido à “escória” do “mundo livre” reclamar ou exigir qualquer piedade. Se algum dia eles ousaram burlar as leis, que paguem por isso. Não importa que esse pagamento seja o mais cruel, tanto quanto os da idade média, aqueles que levam as boas pessoas às lágrimas quando vistos em algum filme de “roliudi”.

O sistema, para se proteger de quem o quer transformar, cria uma pedagogia do medo, mostrando à exaustão o quanto de maldade e terror os “bandidos” espalham pela terra. Não faz distinção entre os criminosos reais e os pobres diabos que buscam sobreviver num mundo de exclusão. Isso tampouco acontece dentro das prisões, nas quais um preso de primeira vez, por roubar um pão, acaba na mesma cela que a de um assassino serial. As prisões, então, em vez de promoverem a tal da reeducação, acabam se transformando em escolas de crime. Muitas vezes, uma pessoa que cometeu um delito simples, sai da penitenciária tão destruída psicologicamente que tudo o que quer é vingança. Daí para outro crime é um passo só.

Hoje, em Florianópolis, as pessoas mais pobres estão de novo pagando pela falta de visão do Estado. Fazendo ouvidos moucos aos reclames dos presos no sistema penitenciário, em vez de dar soluções simples como a garantia dos direitos humanos, o estado faz o contrário. Assim, aviltados, violentados e humilhados, os detentos com vinculação a grupos organizados no mundo do crime, resolvem atuar da mesma forma, impondo ao Estado a mesma violência e humilhação, ainda que a corda venha a queimar na mão dos trabalhadores.

Com as autoridades estatais em estado de baratatontice, não são poucas as vozes que se levantam exigindo um banho de sangue para os criminosos. “Bandido bom é bandido morto”, arengam, enquanto não tiveram um dos seus enredados na teia da rebeldia ou da marginalidade. Acreditam-se completamente livres de coisas assim, por isso babam por vingança. Muitas vezes são até piedosos cristãos, frequentadores de missas e obras de caridade. Criaturas para quem o “direito humano” só deve estar reservado aos “bons”, seus iguais.

Mas, ocorre que “direito humano” é coisa que vale para todos, sejam eles os privilegiados, os ricos, os dominadores, ou os pobres, os excluídos, os marginais, os bons ou os maus. Por isso se diz direito humano e não direito dos ricos, dos bonitinhos ou dos branquinhos. O avanço da sociedade fez com que as pessoas percebessem que punições como as que eram imputadas na idade média, de castigos corporais, torturas e outras barbaridades não eram condizentes com a natureza humana. Daí a necessidade de garantir os direitos, mesmo daqueles que do ponto de vista da lei, cometeram delitos. Para isso existe o direito, para superar a lei do talião, do dente por dente. Só que em momentos de crise é fácil perceber o quanto a humanidade ainda se mantém no passado brutal.

A segurança não é coisa fácil de ser garantida num estado divido por classes com uma abissal diferença econômica entre elas. Tampouco um banho de sangue nas prisões da grande Florianópolis vai trazer a paz. Se a sociedade insistir no dente por dente, olho por olho, isso não vai ter fim. Santa Catarina vive sim uma queda de braço entre o estado e o crime organizado. Mas essa é só a aparência imediata de um problema estrutural. Pode-se vencer com o uso da força ou pode-se atuar no rumo de uma mudança radical no sistema prisional do estado catarinense. E, mesmo isso ainda será um pequeno passo diante da extrema violência que é o sistema capitalista em si.

E aos que clamam por sangue é bom que saibam que o “outro”, ainda que desigual, tem os mesmos direitos de serem tratados com dignidade. Negar isso a eles é deixar-se envolver pelo mesmo véu de alienação e desumanidade, com o qual estão enredados os que cometem os crimes mais vis. É se equipar em vileza e maldade. As pessoas que dioturnamente estão em luta pelos direitos humanos não costumam escolher alvos específicos para o exercício de direitos. Defendem a vida e a dignidade dos policiais, dos trabalhadores, dos motoristas, das autoridades e dos que, premidos pela brutalidade de um sistema que esmaga o humano, assumem o papel de criminosos.

Florianópolis vive dias de caos, com ônibus queimados e gentes assustadas, no mesmo momento em que os trabalhadores da saúde estão parados por melhores salários e condições de trabalho. Assim, da mesma forma como os empresários tem seus bens depredados, os mais pobres, que dependem do serviço público, amargam nos hospitais e nos postos de saúde, sem atendimento. O tratamento dado pelo governador é desigual. Aos empresários, manda escolta policial, aos trabalhadores, corta o ponto e ameaça, deixando os espaços de saúde sem guarnição. Mas, isso, ao que parece, gera indignação em muito poucos...