quinta-feira, 29 de abril de 2010

Extra! Extra! Extra! Médico do SUS é condenado por crime de responsabilidade

A Juíza da 2ª Vara Criminal da Capital, condenou o Médico Slovinski a 14 anos e 4 meses de reclusão, em regime inicialmente fechado, ainda, 71 dias-multa (salário mínimo vigente à época) e a perda da função pública.
Ao acusado é atribuída a prática do delito capitulado no artigo 316, (concussão) caput, por 11 vezes, c/c os artigos 327 e 71, todos do Código Penal.
art. 316. exigir, para si ou para outrém, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida



O médico Fernando José Mendes Slovinski foi condenado em 14 anos e 4 meses de prisão pela prática de concussão (exigir vantagem no exercício da função), na ação penal que responde por cobrar valores de pacientes do Hospital Celso Ramos, em Florianópolis.
Na sentença, a juíza Maria Terezinha Mendonça de Oliveira, da 2ª Vara Criminal da Capital, determinou, ainda, a perda da função pública e a inabilitação para o serviço público de Slovinski, que terá de pagar às vítimas os prejuízos sofridos.
As irregularidades praticadas pelo médico vieram à tona por meio de emissora de televisão local, que exibiu filmagem, efetuada por familiares de Edla Hausmann Weber, da cobrança de R$ 3 mil para realização de exames – que deveriam ser feitos pelo SUS (Sistema Único de Saúde).
Assim como ela, outros 10 pacientes também pagaram para serem atendidos no Hospital Celso Ramos, onde Slovinski estava lotado. O hospital atende principalmente pelo SUS. Os valores cobrados variaram de R$ 3 mil a R$ 6 mil, no período entre outubro de 2004 e junho de 2008, quando as infrações foram reveladas.
Na sentença, a juíza salientou que as pessoas vão ao Hospital Celso Ramos justamente em busca de tratamento gratuito, custeado pelo SUS. Como agravante, ela apontou que, além de usar as instalações da instituição, Slovinski também usava o material, com despesas e prejuízos decorrentes dos atendimentos irregulares, cobrando como médico particular.
Para a magistrada, o médico “aproveitou-se do desespero e da dor das vítimas para obrigá-las a pagar por um serviço que deveria ser gratuito”. A juíza destacou um fato ocorrido no curso do processo: Slovinski procurou duas vítimas, dizendo que lhes devolveria o valor pago, se entregassem todos os documentos apanhados no hospital.
“Com tal atitude, o réu assumiu a prática do delito descrito na exordial acusatória. Iludir pessoas idosas e doentes, quando deveria cuidar da saúde delas. Fazer as pessoas venderem bens móveis para pagar por serviços, que deveriam ser gratuitos”, concluiu Maria Terezinha. Da sentença cabe apelação. (AP n. 023.08.059711-7).
Íntegra da sentença

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Divulgação: STF e a ANISTIA

Recebi pela lista da RENAP e divulgo aqui.

A MAIS ALTA CORTE DO BRASIL DECIDE SOBRE APLICAÇÃO DA LEI DE ANISTIA

Após décadas de espera, a sociedade brasileira viverá amanhã, 28 de abril de 2010, um momento histórico na luta em defesa dos direitos humanos. Finalmente, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidirá se a Lei de Anistia se estende aos agentes públicos e privados envolvidos em graves crimes contra a população civil que resistiu à ditadura militar brasileira. Entre esses crimes se destacam execuções sumárias, torturas e desaparecimentos forçados.
No cenário político nacional, e mundial, a expectativa é grande em relação ao julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 153, ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A ADPF, cujo relator é o Ministro Eros Grau, será o único processo a ser julgado nesta data pelo Plenário do STF.
O Centro Pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) ingressou como amicus curie na referida ADPF, em concordância com a ação ajuizada pela OAB. O objetivo do CEJIL é contribuir para a reflexão do tema por meio de sua experiência adquirida no litígio internacional de casos cujo foco é a ilegitimidade de leis de anistia. Tais leis resultaram na impunidade de graves crimes cometidos durante ditaduras militares ou guerras civis na América Latina.
No julgamento, o CEJIL defenderá em sustentação oral que, de acordo com tratados e decisões de Tribunais Internacionais, leis de anistia não podem impedir a investigação de graves violações cometidas de modo sistemático durante períodos de exceção, em respeito aos direitos à verdade e à justiça das vítimas, suas famílias e de toda a sociedade brasileira.
O julgamento ocorre a partir das 14 horas e pode ser visto no site http://www.tvjustica.jus.br/assista_online.php
Centro pela Justiça e o Direito Internacional

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Alice...

Há quem diga (e eu concordo!) que a histária de Alice no País das Maravilhas não tem nada de infantil! Risos!


Um chá maluco

Havia uma mesa arrumada embaixo de uma árvore, em frente à casa, e a Lebre de Março e o Chapeleiro estavam tomando chá; um Leirão estava sentado entre os dois, dormindo profundamente, e os outros dois o usavam como almofada, descansando sobre ele e conversando sobre sua cabeça. “Muito desconfortável para o Leirão”, pensou Alice, “mas já que ele está dormindo, acho que não se importa.”
A mesa era bem grande, mas os três amontoavam-se num canto. “Não tem lugar! Não tem lugar!”, eles gritaram ao ver Alice chegando. “Tem muito lugar!”, disse Alice com indignação, e sentou-se em uma grande poltrona numa das cabeceiras da mesa.
“Tome um pouco de vinho”, a Lebre de Março ofereceu em um tom encorajador.
Alice olhou ao redor por sobre a mesa e não havia nada senão chá.
“Eu não vejo nenhum vinho”, ela observou.
“Não tem nenhum mesmo”, retrucou a Lebre de Março.
“Então não é muito educado de sua parte oferecer”, respondeu Alice com raiva.
“E não é muito educado de sua parte sentar-se sem ser convidada”, disse a Lebre de Março.
“Eu não sabia que era sua mesa”, insistiu Alice, “ela está arrumada para muito mais que três convidados.”
“Seu cabelo está precisando ser cortado”, disse o Chapeleiro. Ele estivera olhando para Alice por algum tempo com grande curiosidade e esta fora sua primeira intervenção.
“Você deveria aprender a não fazer esse tipo de comentário pessoal”, Alice retrucou com severidade. “Isso é muito grosseiro.”
O Chapeleiro arregalou os olhos ao ouvir isso, mas, tudo que ele disse foi: “Por que um corvo se parece com uma escrivaninha?”
“Legal, vamos ter diversão agora!”, pensou Alice. “Fico feliz que ele tenha começado a propor charadas — acho que posso adivinhar essa”, ela completou em voz alta.
“Você acha que pode encontrar a resposta dessa?” perguntou a Lebre de Março.
“Exatamente”, respondeu Alice.
“Então você pode dizer o que acha”, a Lebre de Março continuou.
“E vou”, Alice replicou rapidamente, “pelo menos — pelo menos, eu acho o que digo — o que é a mesma coisa, você sabe.”
“Não é a mesma coisa nem um pouco!”, disse o Chapeleiro. “Senão você também poderia dizer”, completou a  Lebre de Março, “que ‘Eu gosto daquilo que tenho’ é a mesma coisa que ‘Eu tenho aquilo que gosto.’”
“Seria o mesmo que dizer”, interrompeu o Leirão, que parecia estar falando enquanto dormia, “que ‘Eu respiro enquanto durmo’ é a mesma coisa que ‘Eu durmo enquanto respiro!’”
“Isso é a mesma coisa para você”, disse o Chapeleiro, e nesse ponto a conversa parou e a reunião ficou em silêncio por um minuto. Enquanto isso Alice tentava lembrar tudo que ela sabia sobre corvos e escrivaninhas, que não era muito.
O Chapeleiro foi o primeiro a quebrar o silêncio. “Que dia do mês é hoje?”, perguntou, virando-se para Alice: ele tinha tirado seu relógio do bolso e olhava para ele ansiosamente, chacoalhando-o de vez em quando e levantando-o no ar.
Alice pensou um pouco e então falou: “É dia quatro.”
“Dois dias errado”, suspirou o Chapeleiro. “Eu falei pra você que a manteiga não ia adiantar nada”, ele completou, olhando raivosamente para a Lebre de Março.
“Era a melhor manteiga”, a Lebre de Março replicou mansamente.
“Sim, mas algumas migalhas devem ter caído”, o Chapeleiro rosnou. “Você não deveria ter passado com uma faca de pão.”
A Lebre de Março apanhou o relógio e olhou para ele melancolicamente; então afundou-o na sua xícara de chá, e olhou novamente para ele: mas parecia que não encontrava nada melhor para dizer que o que já dissera: “Era a melhor manteiga, você sabe.”
Alice estivera olhando por cima dos ombros com curiosidade. “Que relógio engraçado!”, ela observou. “Ele diz o dia do mês e não diz a hora!”
“Porque deveria?”, resmungou o Chapeleiro. “Por acaso o seu relógio diz o ano que é?”
“É claro que não”, Alice replicou rapidamente, “mas é porque o ano permanece por muito tempo o mesmo.”
“Este é exatamente o caso do meu”, disse o Chapeleiro.
Alice sentiu-se terrivelmente perturbada. O comentário do Chapeleiro parecia para a menina completamente sem sentido, e ainda assim era inglês. “Eu não estou entendendo nada”, ela disse, o mais educadamente que pôde.
“O Leirão está dormindo novamente”, disse o Chapeleiro, e despejou um pouco de chá quente sobre seu nariz.
O Leirão balançou a cabeça impacientemente e disse, sem abrir os olhos: “É claro, é claro, é justamente o que eu ia dizer.”
“Você já adivinhou a charada?”, perguntou o Chapeleiro, virando-se novamente para Alice.
“Não, eu desisto”, Alice respondeu. “Qual é a solução?”
“Eu não tenho a mínima idéia”, disse o Chapeleiro.
“Nem eu”, disse a Lebre de Março.
Alice suspirou enfastiadamente. “Eu acho que você deveria fazer coisa melhor com seu tempo”, ela disse, “ao invés de gastá-lo com charadas que não têm resposta.”
“Se você conhecesse o Tempo tão bem quanto eu conheço”, o Chapeleiro falou, “não falaria em gastá-lo como se fosse uma coisa. Ele é uma pessoa.”
“Eu não sei o que você está dizendo”, disse Alice.
“Claro que não!”, o Chapeleiro disse, sacudindo a cabeça desdenhosamente. “É muito provável que você nunca tenha falado com o Tempo!”
“Talvez não”, Alice replicou cautelosamente, “mas eu sei que tenho que marcar o tempo quando aprendo música.”
“Ah! Isso explica”, concluiu o Chapeleiro. “Ele não vai ficar marcando compasso para você. Agora, se você ficar numa boa com ele, poderá fazer o que quiser com o relógio. Por exemplo, suponha que são nove horas da manhã, bem a hora de começar a fazer as lições de casa, você apenas tem que insinuar no ouvido do Tempo e o ponteiro dá uma virada num piscar de olhos! Uma e meia, hora do almoço!”
(“Eu queria que fosse”, a Lebre de Março disse para si mesma num sussurro.)
“Isso seria ótimo, com certeza”, disse Alice pensativamente; “mas então... eu poderia ainda não estar
com fome, você sabe.”
“A princípio não, talvez”, retomou o Chapeleiro, “mas você poderia ficar na uma e meia da tarde tanto tempo quanto você quisesse.”
“É assim que você faz?”, perguntou Alice.
O Chapeleiro balançou a cabeça com ar de lamento. “Eu não”, ele replicou. “Eu e o Tempo tivemos uma disputa março passado... um pouco antes dela enlouquecer, você sabe...”
(apontando a Lebre de Março com a colher de chá) “... foi no grande concerto dado pela Rainha de Copas e eu tinha que cantar Pisca, pisca, pequeno morcego! Como eu queria saber onde você está!
“Você conhece a canção, por acaso?”
“Já ouvi alguma coisa parecida”, disse Alice.
“Ela continua, você sabe”, o Chapeleiro prosseguiu, “dessa maneira: 

Muito acima do mundo você voa,
Parece uma bandeja de chá no céu,
Pisca, pisca...”
 
Nesse instante o Leirão estremeceu e começou a cantar dormindo 

“Pisca, pisca, pisca, pisca...” e continuou repetindo tantas vezes a palavras que tiveram que lhe dar um beliscão para que ele parasse.
“Bem eu mal tinha acabado de cantar o primeiro verso”, disse o Chapeleiro, “quando a Rainha berrou ‘Ele está matando o tempo! Cortem-lhe a cabeça!’”
“Que selvageria”, exclamou Alice.
“E desde então”, o Chapeleiro continuou num tom de lamento, “ele não faz nada do que eu peço! É sempre seis da tarde agora!”
Uma idéia brilhante veio à mente de Alice. “Esta é a razão de tantas coisas para o chá colocadas na mesa?” ela perguntou.
“É, é isso”, respondeu o Chapeleiro com um suspiro, “é sempre hora do chá, e nós não temos tempo de lavar as coisas entre um chá e outro.”
“Então vocês ficam rodando em volta da mesa, não é?”, disse Alice.
“Exatamente”, disse o Chapeleiro, “à medida que as coisas vão ficando sujas.”
“Mas o que acontece quando vocês chegam ao início outra vez?”, Alice aventurou-se a perguntar.
“Eu proponho que mudemos de assunto”, a Lebre de Março interrompeu, bocejando. “Estou ficando cansada disso. Eu voto para que a jovem senhorita conte-nos uma história.”
“Eu temo que não conheço nenhuma”, disse Alice, um pouco alarmada com a proposta.
“Então o Leirão contará!”, os outros dois gritaram.“Acorde, Leirão!” E beliscaram-no dos dois lados.
O Leirão abriu os olhos lentamente. “Eu não estava dormindo”, ele falou numa voz rouca, fraquinha, “eu ouvi cada palavra que meus amigos falavam.”
“Conte-nos uma história!”, disse a Lebre de Março.
“Sim, por favor!”, implorou Alice.
“E seja rápido”, completou o Chapeleiro, “ou você poderá dormir novamente antes de acabar.”
“Era uma vez três irmãzinhas”, ele começou  apressadamente, “e seus nomes eram Elsie, Lacie e Tillie, e elas viviam no fundo de um poço...”
“E o que elas comiam?”, perguntou Alice, que sempre se interessava pelas questões sobre comida e bebida.
“Elas comiam melado”, respondeu o Leirão, depois de pensar por um minuto ou dois.
“Elas não poderiam viver só de melado, você sabe”, Alice observou gentilmente. “Elas ficariam doentes.”
“E ficaram”, disse o Leirão, “muito doentes.”
Alice tentou um pouquinho imaginar quão extraordinário seria este modo de vida, mas ficou muito confusa e assim,  continuou: “Mas porque elas viviam no fundo de um poço?”
“Tome mais um pouco de chá”, ofereceu a Lebre de Março para Alice, com um ar sério.
“Mas eu ainda não tomei nada”, replicou Alice em um tom ofendido, “portanto eu não posso tomar mais.”
“Você quer dizer que não pode tomar menos”, disse o Chapeleiro, “é mais fácil tomar mais do que nada.”
“Ninguém perguntou sua opinião”, disse Alice.
“Quem está fazendo observações pessoais agora?”, o Chapeleiro perguntou triunfalmente.
Alice não tinha o que responder no momento, daí, aproveitou para tomar um pouco de chá com torradas.
Virou-se então para o Leirão e repetiu sua pergunta: “Porque elas viviam no fundo de um poço?”
Mais uma vez o Leirão demorou um minuto ou dois para responder e então disse: “Era um poço de melado.”
“Isso não existe!”, Alice estava ficando muito brava, mas o Chapeleiro e a Lebre de Março começaram a fazer psiu e o Leirão com um ar amuado observou: “Se você não consegue se comportar civilizadamente, é melhor que acabe a história por conta própria.”
“Não, por favor, continue!”, disse Alice humildemente. “Eu não vou mais interromper. É muito provável que existe mesmo um poço assim.”
“Um, certamente!”, retomou o Leirão indignadamente.
Entretanto, ele continuou. “Bem, daí as três irmãzinhas...elas estavam aprendendo a extrair, sabe...”
“O que elas extraíam?”, perguntou Alice, já esquecendo da promessa.
“Melado”, respondeu o Leirão, sem levar em conta a quebra da promessa, dessa vez.
“Eu quero uma xícara limpa”, interrompeu o Chapeleiro, “vamos mudar de lugar.”
Ele avançou um lugar enquanto falava, e o Leirão o seguiu, a Lebre de Março ficou no seu lugar e Alice com má  vontade ficou com o lugar da Lebre de Março. O Chapeleiro foi o único que ficou com a xícara limpa e Alice ficou em um lugar bem pior do que estava antes, pois a Lebre de Março
tinha acabado de derramar leite no prato.
Alice não queria ofender o Leirão novamente, por isso começou a falar com cautela:“Mas eu não entendi. De onde elas extraíam o melado?”
“Você pode extrair água de um poço de água”, disse o Chapeleiro, “portanto eu acho que pode extrair melado de um poço de melado, não é, imbecil?”
“Mas elas estavam dentro do poço”, Alice disse para o Leirão, como se não tivesse ouvido o último comentário.
“É claro que estavam”, respondeu o Leirão, “bem no fundo”.
Esta resposta confundiu de tal forma a pobre Alice, que ela deixou o Leirão prosseguir por algum tempo sem interrompê-lo.
“Elas estavam aprendendo a extrair”, continuou o Leirão, bocejando e esfregando os olhos, pois estava ficando com muito sono, “e elas extraíam todo tipo de coisas...tudo o que começava com M...”
“Por que com M?”, disse Alice.
“Por que não?” respondeu a Lebre de Março.
Alice ficou em silêncio.
O Leirão aproveitou para fechar os olhos e já estava  começando a cochilar, mas, ao ser beliscado pelo Chapeleiro, acordou novamente com um gritinho e continuou, “...que começava com M, como mouse-traps (ratoeira) e moon (lua) e memory (memória, lembranças) e muchness (advérbio de intensidade)... você sabe, quando você diz que as coisas são um monte de muitão... você já pensou nisso como um extração de muitão?”
“Realmente, agora que você me pergunta”, disse Alice, bem confusa, “eu acho que não...”
“Então você não deveria falar nada”, disse o Chapeleiro.
Esse tipo de grosseria era mais do que Alice conseguia suportar: ela levantou-se muito brava e foi saindo. O Leirão caiu no sono imediatamente e nenhum dos outros dois deu a mínima para sua saída, embora ela tenha olhado para trás uma ou duas vezes, meio que querendo que eles a chamassem. A última vez que Alice os avistou eles estavam tentando enfiar o Leirão dentro do bule de chá.
“Eu não volto lá de jeito nenhum!”, disse Alice, enquanto abria caminho em direção à floresta. “Foi o mais estúpido chá do qual participei em toda minha vida!”
Ao dizer isso ela percebeu que uma das árvores tinha uma porta que dava para seu interior. “Que curioso!”, ela pensou. “Mas tudo está tão curioso hoje. Eu acho que posso muito bem entrar nessa árvore.” E entrou. Uma vez mais ela encontrou-se naquela sala comprida e com a pequena mesa de vidro. “Desta vez já sei como fazer”, ela disse para si mesma, e começou por apanhar a pequena chave dourada, depois abriu a porta que dava para o jardim. Só então ela começou a mordiscar o cogumelo (que ela mantivera em seu bolso) até que estivesse com mais ou menos 30 centímetros de altura: daí ela atravessou a pequena passagem e então... ela estava em um lindo jardim entre canteiros de flores resplandecentes e fontes de água fresca.





sexta-feira, 23 de abril de 2010

[STF] A Idade Mendes, por Leandro Fortes

Caríssim@s,
Trago este excelente artigo de Leandro Fortes sobre a "Era Mendes"... e seus enlaces nada sociais... vale a leitura!


Que venha o próximo Ministro Presidente do STF...

A Idade Mendes

Posted by Leandro Fortes under Justiça
No fim das contas, a função primordial do ministro Gilmar Mendes à frente do Supremo Tribunal Federal foi a de produzir noticiário e manchetes para a falange conservadora que tomou conta de grande parte dos veículos de comunicação do Brasil. De forma premeditada e com muita astúcia, Mendes conseguiu fazer com que a velha mídia nacional gravitasse em torno dele, apenas com a promessa de intervir, como de fato interveio, nas ações de governo que ameaçavam a rotina, o conforto e as atividades empresariais da nossa elite colonial. Nesse aspecto, os dois habeas corpus concedidos ao banqueiro Daniel Dantas, flagrado no mesmo crime que manteve o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda no cárcere por 60 dias, foram nada mais que um cartão de visitas. Mais relevante do que tudo foi a capacidade de Gilmar Mendes fixar na pauta e nos editoriais da velha mídia a tese quase infantil da existência de um Estado policialesco levado a cabo pela Polícia Federal e, com isso, justificar, dali para frente, a mais temerária das gestões da Suprema Corte do País desde sua criação, há mais cem anos.

Num prazo de pouco menos de dois anos, Mendes politizou as ações do Judiciário pelo viés da extrema direita, coisa que não se viu nem durante a ditadura militar (1964-1985), época em que a Justiça andava de joelhos, mas dela não se exigia protagonismo algum. Assim, alinhou-se o ministro tanto aos interesses dos latifundiários, aos quais defende sem pudor algum, como aos dos torturadores do regime dos generais, ao se posicionar publicamente contra a revisão da Lei da Anistia, de cuja à apreciação no STF ele se esquivou, herança deixada a céu aberto para o novo presidente do tribunal, ministro Cezar Peluso. Para Mendes, tal revisão poderá levar o País a uma convulsão social. É uma tese tão sólida como o conto da escuta telefônica, fábula jornalística que teve o presidente do STF como personagem principal a dialogar canduras com o senador Demóstenes Torres, do DEM de Goiás.

A farsa do grampo, publicada pela revista Veja e repercutida, em série, por veículos co-irmãos, serviu para derrubar o delegado Paulo Lacerda do comando da PF, com o auxílio luxuoso do ministro da Defesa, Nelson Jobim, que se valeu de uma mentira para tal. E essa, não se enganem, foi a verdadeira missão a ser cumprida. Na aposentadoria, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá tempo para refletir e registrar essa história amarga em suas memórias: o dia em que, chamado “às falas” por Gilmar Mendes, não só se submeteu como aceitou mandar para o degredo, em Portugal, o melhor e mais importante diretor geral que a Polícia Federal brasileira já teve. O fez para fugir de um enfrentamento necessário e, por isso mesmo, aceitou ser derrotado. Aliás, creio, a única verdadeira derrota do governo Lula foi exatamente a de abrir mão da política de combate permanente à corrupção desencadeada por Lacerda na PF para satisfazer os interesses de grupos vinculados às vontades de Gilmar Mendes.

O presidente do STF deu centenas de entrevistas sobre os mais diversos assuntos, sobretudo aqueles sobre os quais não poderia, como juiz, jamais se pronunciar fora dos autos. Essa é, inclusive, a mais grave distorção do sistema de escolha dos nomes ao STF, a de colocar não-juízes, como Mendes, na Suprema Corte, para julgar as grandes questões constitucionais da nação. Alheio ao cargo que ocupava (ou ciente até demais), o ministro versou sobre tudo e sobre todos. Deu força e fé pública a teses as mais conservadoras. Foi um arauto dos fazendeiros, dos banqueiros, da guarda pretoriana da ditadura militar e da velha mídia. Em troca, colheu farto material favorável a ele no noticiário, um relicário de elogios e textos laudatórios sobre sua luta contra o Estado policial, os juízes de primeira instância, o Ministério Público e os movimentos sociais, entre outros moinhos de vento vendidos nos jornais como inimigos da democracia.

Na imprensa nacional, apenas CartaCapital, por meio de duas reportagens (“O empresário Gilmar” e “Nos rincões de Mendes”), teve coragem de se contrapor ao culto à personalidade de Mendes instalado nas redações brasileiras como regra de jornalismo. Por essa razão, somos, eu e a revista, processados pelo ministro. Acusa-nos, o magistrado, de má fé ao divulgar os dados contábeis do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), uma academia de cursinhos jurídicos da qual Mendes é sócio. Trata-se de instituição construída com dinheiro do Banco do Brasil, sobre terreno público praticamente doado pelo ex-governador do DF Joaquim Roriz e mantido às custas de contratos milionários fechados, sem licitação, com órgãos da União.

Assim, a figura de Gilmar Mendes, além de tudo, está inserida eternamente em um dos piores momentos do jornalismo brasileiro. E não apenas por ter sido o algoz do fim da obrigatoriedade do diploma para se exercer a profissão, mas, antes de tudo, por ter dado enorme visibilidade a maus jornalistas e, pior ainda, fazer deles, em algum momento, um exemplo servil de comportamento a ser seguido como condição primordial de crescimento na carreira. Foi dessa simbiose fatal que nasceu não apenas a farsa do grampo, mas toda a estrutura de comunicação e de relação com a imprensa do STF, no sombrio período da Idade Mendes.

Emblemática sobre essa relação foi uma nota do informe digital “Jornalistas & Companhia”, de abril de 2009, sobre o aniversário do publicitário Renato Parente, assessor de imprensa de Gilmar Mendes no STF (os grifos são originais):

“A festa de aniversário de 45 anos de Renato Parente, chefe do Serviço de Imprensa do STF (e que teve um papel importante na construção da TV Justiça, apontada como paradigma na área da tevê pública), realizada na tarde do último domingo (19/4), em Brasília, mostrou a importância que o Judiciário tem hoje no cenário nacional. Estiveram presentes, entre outros, a diretora da Globo, Sílvia Faria, a colunista Mônica Bergamo, e o próprio presidente do STF, Gilmar Mendes, entre outros.”

Olha, quando festa de aniversário de assessor de imprensa serve para mostrar a importância do Poder Judiciário, é sinal de que há algo muito errado com a instituição. Essa relação de Renato Parente com celebridades da mídia é, em todos os sentidos, o pior sintoma da doença incestuosa que obriga jornalistas de boa e má reputação a se misturarem, em Brasília, em cerimônias de beija-mão de caráter duvidoso. Foi, como se sabe, um convescote de sintonia editorial. Renato Parente é o chefe da assessoria que, em março de 2009, em nome de Gilmar Mendes, chamou o presidente da Câmara, deputado Michel Temer (PMDB-SP), às falas, para que um debate da TV Câmara fosse retirado do ar e da internet. Motivo: eu critiquei o posicionamento do presidente do STF sobre a Operação Satiagraha e fiz justiça ao trabalho do delegado federal Protógenes Queiroz, além de citar a coragem do juiz Fausto De Sanctis ao mandar prender, por duas vezes, o banqueiro Daniel Dantas.

Certamente em consonância com o “paradigma na área de tevê pública” da TV Justiça tocada por Renato Parente, a censura na Câmara foi feita com a conivência de um jornalista, Beto Seabra, diretor da TV Câmara, que ainda foi mais além: anunciou que as pautas do programa “Comitê de Imprensa”, a partir dali, seriam monitoradas. Um vexame total. Denunciei em carta aberta aos jornalistas e em todas as instâncias corporativas (sindicatos, Fenaj e ABI) o ato de censura e, com a ajuda de diversos blogs, consegui expor aquela infâmia, até que, cobrada publicamente, a TV Câmara foi obrigada a capitular e recolocar o programa no ar, ao menos na internet. Foi uma das grandes vitórias da blogosfera, até então, haja vista nem um único jornal, rádio ou emissora de tevê, mesmo diante de um gravíssimo caso de censura e restrição de liberdade de expressão e imprensa, ter tido coragem de tratar do assunto. No particular, no entanto, recebi centenas de e-mails e telefonemas de solidariedade de jornalistas de todo o país.

Não deixa de ser irônico que, às vésperas de deixar a presidência do STF, Gilmar Mendes tenha sido obrigado, na certa, inadvertidamente, a se submeter ao constrangimento de ver sua gestão resumida ao caso Daniel Dantas, durante entrevista no youtube. Como foi administrada pelo Google, e não pelo paradigma da TV Justiça, a sabatina acabou por destruir o resto de estratégia ainda imaginada por Mendes para tentar passar à história como o salvador da pátria ameaçada pelo Estado policial da PF. Ninguém sequer tocou nesse assunto, diga-se de passagem. As pessoas só queriam saber dos HCs a Daniel Dantas, do descrédito do Judiciário e da atuação dele e da família na política de Diamantino, terra natal dos Mendes, em Mato Grosso. Como último recurso, a assessoria do ministro ainda tentou tirar o vídeo de circulação, ao menos no site do STF, dentro do sofisticado e democrático paradigma de tevê pública bolado por Renato Parente.

Como derradeiro esforço, nos últimos dias de reinado, Mendes dedicou-se a dar entrevistas para tentar, ainda como estratégia, vincular o próprio nome aos bons resultados obtidos por ações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), embora o mérito sequer tenha sido dele, mas de um juiz de carreira, Gilson Dipp. Ministro do Superior Tribunal de Justiça e corregedor do órgão, Dipp foi nomeado para o cargo pelo presidente Lula, longe da vontade de Gilmar Mendes. Graças ao ministro do STJ, foi feita a maior e mais importante devassa nos tribunais de Justiça do Brasil, até então antros estaduais intocáveis comandados, em muitos casos, por verdadeiras quadrilhas de toga.

É de Gilson Dipp, portanto, e não de Gilmar Mendes, o verdadeiro registro moralizador do Judiciário desse período, a Idade Mendes, de resto, de triste memória nacional.

Mas que, felizmente, se encerra hoje.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Atualizando o Cidadão Kaine: Globo e Serra 45 anos... tudo a ver!!!

Sabe o que mais tem me impressionado ultimamente?
É vivenciar a força de um veículo de comunicação um pouco mais democrático que o cansativo arsena da PIG...
à luta Comapnheir@s!
(eles tentarão o Golpe, mas temos de reforçar as bases da resistência!)
Abraços, Dani FeliZ

 




Da série ficção, a preferida dos internautas.
Começou com um telefonema de um ator consagrado para o diretor do núcleo.
Ele estava irado com a peça promocional que foi ao ar na noite de Domingo.
Era um institucional de trinta segundos em que ele dizia apenas duas palavras.
Mas a montagem induzia o telespectador a acreditar que se tratava, não de uma campanha de aniversário da maior emissora de televisão do país, mas um mosaico grosseiro cujo slogan “a gente faz sempre mais” é uma clara alusão ao do candidato José Serra.
E para corroborar com a leviandade, ainda vinha o número quarenta e cinco assinado na peça, ao lado do logotipo.
Ao todo, foram quarenta celebridades entre as turmas das produções, humor, shows, esporte e jornalismo.
Achei até curioso a manifestação ter partido de um ator e não de um de nós.
Afinal, vendemos a eles apenas nossa força de trabalho, não nossas consciências.
Será?
Nem sei mais…
O ator foi duro e franco com o executivo da empresa.
Se alguma providência não fosse tomada, ele ia aos jornais dizer que foi vítima de manipulação.
Era tudo o que a emissora não queria ouvir nessa altura do campeonato.
Ainda que seu candidato pudesse ser o mesmo que o da emissora, ele jamais se sujeitaria a trabalhar naquelas condições.
E antes de desligar, avisou: Eu não estou sozinho.
O diretor pediu paciência, disse que ia encontrar uma saída.
Pensou em quem confiar num momento desses de conflito: talvez um executivo que tivesse bom transito com o jornalismo.
Afinal, foi coisa dos herdeiros da Corte do Cosme Velho, incentivados pelo Guardião da Doutrina da Fé, pensou.
Assim que amanheceu propôs o encontro ao executivo que considerou ser hábil o bastante para apagar o fogo.
Nisso a internet já fervilhava.
Pressões vinham de todos os lados, a opinião pública, os patrocinadores, os políticos, os amigos.
É preciso convencer a direção de que foi um tiro no pé.
Mas como fazer isso?
Juntando argumentos.
E lá foram os dois tentar convencer os acionistas de que aquilo fora um erro.
Os artistas respeitam os interesses comerciais e políticos da emissora, mas consideram que não cabe a eles exercer esse papel institucionalmente.
O artista é o vendedor de sonhos e ilusões para todos, não só para um determinado grupo político.
Afora os artistas, tem os jornalistas que emprestam sua credibilidade à emissora.
Ações assim podem arranhar para sempre esse vínculo com o telespectador.
E assim foram as tratativas durante toda a tarde.
Ok, mas qual seria a solução?
Pensaram em várias.
Ao final do encontro triunfou aquela que diz assim: “O texto do filme em comemoração aos 45 anos da Rede Globo foi criado – comprovadamente – em novembro do ano passado, quando não existiam nem candidaturas muito menos slogans. Qualquer profissional de comunicação sabe que uma campanha como esta demanda tempo para ser elaborada. Mas a Rede Globo não pretende dar pretexto para ser acusada de ser tendenciosa e está suspendendo a veiculação do filme.”
Esta noite não vai ser boa, nem para o Guardião, nem para a Central de Comunicação, e muito menos para o patrão. Nós aqui fora sabemos de tudo! O Povo não é bobo. Fiquem espertos.


PS do Azenha: Com a experiência que tenho em televisão, sei como essas coisas funcionam. O conjunto da obra só fica claro para quem gravou alguns segundos de uma peça ficcional quando ela é apresentada ao público. Duvido que tenha sido a internet a responsável pela decisão da emissora. Atribuo isso, acima de tudo, à reação interna e ao medo de que houvesse protestos públicos de quem se sentiu ludibriado!


(Fonte: Vi O Mundo)

Viva a sociedade do controle!!!!


Já não é a primeira e nem será a última vez que ouviremos as arrogâncias e prepotências da eterna briga pelo PODER (ou seria pelo EGO?) e pela AUTORIDADE!
A PM apreende o carro do Filho de uma Desembargadora e, sabendo da irregularidade, usa do seu "poder" (IN)discricionário para suplantar a legalidade.
Não venho aqui fazer apologia ao positivismo não... o que quero mostrar é que o positivismo jurídico aliado às tecnologias do controle, sob as bandeiras de "lei e ordem", servem também para os detentores dos poderes institucionais constuídos... 
Esquecem eles que a SOCIEDADE DO CONTROLE não tira folga, não tem revezamento de turnos e, sequer, necessita de pagamento de horas extras .
A Sociedade do Controle está (e ponto). E SORRIAM SEMPRE, POIS UM DIA VOCÊ TAMBÉM SERÁ FILMADO!
De que adianta saber quem é o interlocutor na hora em que se constata a ausência de recolhimento da verba que sustenta o Estado (e que ironicamente, ela mesma julga?). De fato... perdeu a oportunidade de ficar :X

PS. Diz (possivelmente o filho da Desa): "(...) não somos delinquentes (...)".
Não sei se eu sou Burra (embora o Pai dos Burros já exista na versão digital!), mas ao que me consta, delinquente é todo o indivíduo que comete uma infração, vejamos: "Diz-se de pessoa que delinquiu ou que é dada a cometer delitos, crimes ou infrações"



Refresca-se a memória dos esquecidos:

CRIMES DE TRÂNSITO: dirigir com a Habilitação cassada ou com a Permissão suspensa: Detenção de 6 meses a 1 ano, multa e nova suspensão ou proibição para dirigir.
FALTAS GRAVES: Dirigir com a Carteira ou a Permissão cassada ou suspensa.
- multa de 900 UFIRs e apreensão do veículo.
Well, well, well... como sempre digo: mais um tiro no pé dessa Sociedade do Controle!

segunda-feira, 19 de abril de 2010

USO ABUSIVO DE MEDICAMENTOS


Caríssim@s, 
Dando continuidade ao debate sobre drogas.
É claro que o dito "cidadão de bem" não usa drogas, usa medicação, mas será que "eles" têm noções sobre a quantidade de drogas (lícitas) que ingerem nesta briga científica e laboratorial?  
Isso leva à uma dúvida crucial para este assunto o que é droga e o que é remédio?

Excelente artigo do Dr. Paulo Trevisol Bittencourt, neurologista e professor do Curso de Medicina da UFSC.


USO ABUSIVO DE MEDICAMENTOS
Dr.Paulo César Trevisol Bittencourt
Professor de Neurologia da UFSC - www.neurologia.ufsc.br
pcb@neurologia.ufsc.br - pauloctbittencourt@yahoo.com.br

Medicina é a arte de entreter a doença enquanto a mãe natureza faz o seu papel.
Com certeza, ele não deveria ser interpretado como um dogma religioso, mas sim como uma regra simples para um emprego sábio dos nossos venenos. E, com sinceridade, pessoas atormentadas por problemas de saúde não precisariam usar tantos medicamentos como sugere a monstruosa indústria farmacêutica. E os responsáveis por sua prescrição, jamais deveriam perder de vista o potencial tóxico que todo ele carrega consigo. E para facilitar esta compreensão, o ensino de Toxicologia – quase inexistente - deveria ser incrementado nas escolas médicas do Brasil.
Desgraçadamente a picaretagem transformou-se em um mal universal e práticas similares estão acontecendo em qualquer parte do mundo e em qualquer outra atividade também. Profissionais íntegros e de índole crítica são capazes de identificá-las com facilidade. Deles se espera reação diante da tirania mercadológica que torna insultuosa a prática médica atual.


INTRODUÇÃO
Jamais médicos dispuseram de tantas opções farmacológicas no tratamento de seus pacientes; todavia, vivemos em uma perigosa encruzilhada. Diuturnamente as indústrias lançam novas e miraculosas “hóstias farmacêuticas”, a imensa maioria das quais acompanhada de ardilosa propaganda que lhes atribui um potencial fantástico e omite seus efeitos colaterais. Poucos destes novos medicamentos resistem a uma década de uso; na verdade, a maioria é abandonada após alguns anos de utilização, tempo suficiente para nos darmos conta da sua falta de eficácia ou da sua toxicidade generosa, criminosamente omitida nas suas burlas. Tragicomicamente, algumas destas drogas, mudam radicalmente de indicação com o passar dos anos, denunciando uma torpe fraude mercantilista que tem no lucro a qualquer custo sua única meta.
A Organização Mundial de Saúde nos oferece para reflexão a seguinte informação: 10 até 40% por cento das pessoas internadas em um hospital qualquer deste Mundo, têm na iatrogenia medicamentosa a sua justificativa. Note, por favor, na aritmética acima estão excluídas as cirurgias desnecessárias; com certeza, responsáveis por um número ainda mais expressivo de internações hospitalares. Por outro lado é banal ver pacientes tomando cinco, seis, sete... dez ou mais (meu record pessoal é quinze) diferentes drogas legais e obviamente intoxicados. Porém, sintomas secundários a over dosis medicamentosa são atribuídos à idade ou severidade da sua doença (ou a ambos) e nunca identificados apropriadamente. É trágico notar como uma nova medicação é introduzida na expectativa de combater efeitos colaterais do coquetel medicamentoso prescrito. Em razão disso, muitas vezes, os efeitos tóxicos dos remédios empregados superam, e muito, as dificuldades provocadas pela doença original responsável pela sua prescrição. Notável perceber, nauseado é bem verdade, que exames complementares supostamente anormais são a pseudo-doença e a razão para prescrições estapafúrdias.
Porque prescrevemos abusivamente é uma questão intrigante e de difícil resposta. Apesar de ter consciência da sua multifatoriedade, irei tentar descrever seus principais motivadores. Infelizmente, nós médicos não somos imunes à propaganda enganosa que grassa igualmente em todas as outras áreas da sociedade. Aliás, é freqüente sermos pressionados pelos próprios pacientes e familiares, para receitarmos medicamentos com supostos efeitos fantásticos, vistos pelos mesmos, nas mais diversas formas de maquiavélico marketing comercial, muitas vezes subliminar.
Por outro lado, a competição entre nós, cada vez mais despida de qualquer vestígio ético, nos torna ainda mais vulneráveis aos apelos de natureza econômica. Assim, comportamentos francamente bizarros, outrora passíveis de punição, foram incorporados a nossa rotina como normais. Exemplificando, pesquisadores e professores de escolas médicas, em troca de algum tipo de recompensa informal, monetária em espécie ou espelhinhos à portuguesa – como nos tempos do Brasil colônia - não raro são aliciados para fazerem à apologia das novas e revolucionárias panacéias. Estudantes, ludibriados na sua boa fé, já médicos, tendem a seguirem de maneira acrítica os ensinamentos do falso mestre. Além disso, é notável perceber a contribuição emprestada por um ensino médico equivocado e desgraçadamente dogmático, no qual os aprendizes da arte de curar são treinados para focarem sua atenção na doença e desprezarem o doente. Assim, além de exagerarem na solicitação de exames complementares desnecessários, deixam de perceber que em inúmeras situações cotidianas, carinho e atenção, medicamentos que não possuem efeitos colaterais, são muito mais eficazes que pílulas. Mais ainda, ignoram que ao não identificarem a pessoa, através de uma judiciosa história e exame clínico, também não serão capazes de identificar a razão do seu sofrimento.
Já no século XVI dizia o suiço Philippus Aureolus Theophrastus Bombastus von Hohenheim, mais conhecido pela alcunha paterna de Paracelsus..."Todas as substâncias são venenosas; não há nenhuma que não o seja. É a dosagem certa que distingue entre o veneno e o remédio”. Assim, para que não paire nenhuma dúvida, remédios são venenos que exigem sabedoria para deles se tirar algum proveito. Embora pareça anacrônico, urge o resgate deste conceito medieval para minimizarmos o sofrimento causado pelas distorções da prática médica contemporânea.
Finalmente, gostaria de lhes enfatizar um fato, são a empatia, o bom humor e o entusiasmo do curandeiro, independentemente da sua qualificação técnica, as “drogas” mais poderosas que existem. O efeito terapêutico de um determinado medicamento é diretamente proporcional à fé depositada no profissional que o prescreve. Desta maneira, demonstrar real interesse, atenção e simpatia para com as pessoas em sofrimento, constituem pré-requisito para o sucesso de qualquer tipo de terapia. Este ritual, sempre deverá ser envolvido por uma atmosfera de sincera honestidade de propósitos e de otimismo. Quando tais ferramentas são empregadas, surgem imediatamente sentimentos de confiança e fé, e aí então o que menos importa é o tipo de médico, se alopata ou homeopata. A única coisa que ele não poderá ser é burropata e ignorar preceitos básicos de fisio-farmacologia.
A medicalização excessiva é um dos grandes males da saúde atual, responsável por um número fantástico de vítimas nas mais diversas especialidades médicas. E é surreal observar que estas pessoas ignoram estarem reféns do seu próprio tratamento.
A despeito de estar ciente de que este é um tema inesgotável, comento abaixo alguns exemplos de iatrogenia cometidos pela Medicina convencional, na expectativa de que os mesmos contribuam para melhorar a vida das pessoas que buscam nossa ajuda. Muito me gratificaria que este texto encorajasse colegas de outras especialidades e igualmente pessoas leigas a exporem seus pontos de vista.
 
ANOREXÍGENOS
Anorexígenos são substâncias usadas com o intuito de promover aversão a alimentos e assim se obter perda de peso no usuário. Maioria delas contém anfetamina ou derivados. É verdade inquestionável que realmente promovem emagrecimento; porém, é igualmente verdadeiro que são responsáveis por inúmeros e graves efeitos colaterais. Sintomas de natureza psíquica são inúmeros. Estes incluem ansiedade, irritabilidade, euforia, melancolia reacional, surtos psicóticos, idéias suicidas, etc.
Com exagerada freqüência, pessoas usuárias destas drogas ficam prisioneiras do próprio tratamento e transformadas em pacientes psiquiátricos. Desta maneira, o benefício da redução de peso é apenado com um tributo pesado – a perda da sanidade mental. Logo, a espelhada e agradável auto-imagem emagrecida, em pouco tempo, será substituída por um perigoso sentimento de frustração. Assim, indivíduos deteriorados psiquicamente não irão tirar nenhum proveito de uma estética supostamente melhorada. Pior ainda, costuma ter um efeito rebote, o ganho de peso após sua supressão, costuma ser ainda maior que a perda obtida durante o período de uso.
Obesidade é uma condição complexa e, aliás, reverenciada como normal em muitas sociedades; assim, para uma melhor compreensão da mesma, seus acometidos deveriam ser objetos de judiciosa avaliação médica e psicosocial. Por isso mesmo, abordagens apropriadas deveriam levar em conta aspectos da personalidade e a maneira de viver do indivíduo. Por outro lado, é comum ver formulações mágicas, desenvolvidas por mercadores inconseqüentes e para uso coletivo. Ora, ao não considerar a pessoa, com certeza, todas serão fraudulentas e somente por mero acaso irão atingir seu alvo. Algumas delas, de tão bizarras, promovem uma rápida ruína psíquica; não constituindo raridade ver suas vítimas cometendo suicídio, devido à ação depressiva de alguns componentes da fórmula.
É triste observar que o diagnóstico ou sentimento de obesidade, muitas vezes, é de natureza psicogênica; isto é, ela não existe de fato, sendo induzido artificialmente por modismos de beleza extravagantes. Fora desta discussão estão aquelas pessoas vitimadas por obesidade mórbida. Estas deveriam ser consideradas para um tratamento adequado e dispensadas do uso nefasto de anfetaminas.
 
A TRAGÉDIA BARBITÚRICA
Fenobarbital (PB) foi descoberto na Alemanha em 1912, precisamente no dia de Santa Bárbara, inspiradora do seu nome. É a droga barbitúrica mais usada no mundo. No Brasil é comercializada com os nomes de “gardenal” e “edhanol”.
Em primeiro lugar, gostaria de lhes reafirmar uma convicção: barbitúricos são altamente eficientes para impedir a recorrência de ataques epiléticos diversos. Sinceramente, não vislumbro dentre as atuais drogas antiepiléticas (DAE), alguma com eficácia superior. Contudo, a performance de uma DAE não pode ser medida exclusivamente pela sua habilidade em anular epilepsia; assim, seus potenciais efeitos negativos nunca deveriam ser perdidos de vista pelo terapêuta responsável. Com relação a PB, demoramos excessivamente para reconhecer seu mais grave problema: é extremamente difícil encontrar um usuário crônico que não desenvolva barbiturismo, isto é, a combinação de sonolência (ou paradoxal hipercinesia) com transtornos cognitivo-comportamentais em grau variado. Como crianças e adolescentes são particularmente vulneráveis, é possível inferir o fantástico número delas que foram desgraçadas pelo uso abusivo de PB até recentemente entre nós. Muitos dos seus usuários, prisioneiros do próprio tratamento, foram transformados em pacientes psiquiátricos e encaminhados para “tratamento especializado” em deprimentes masmorras psiquiátricas espalhadas pelo país, onde profissionais incapazes de identificar a óbvia origem das suas dificuldades, não somente aumentavam a dose do “medicamento”, bem como prescreviam outras drogas, igualmente não inocentes, para o “tratamento” dos típicos efeitos barbitúricos, consagrando uma brutal iatrogenia. Além disso, depressão grave induzida pelo seu uso prolongado, é demasiado freqüente para ser ignorada, e, com toda certeza, foi responsável por muitos dos suicídios vistos na população sofredora de epilepsia. Por isso, deveríamos dar um basta definitivo na tragicomédia representada pela prescrição de medicação antidepressiva para o tratamento deste comum efeito colateral.
Para aqueles que tão obstinadamente defendem seu emprego indiscriminado, sugiro uma pausa para reflexão: será que os fabulosos escritores Dostoiévski e Machado de Assis teriam a mesma produção literária tomando PB diariamente? Imaginem o desastre que seria Júlio César ou Alexandre da Macedônia liderando campanhas militares, ingerindo PB todas as noites. O imperador romano então, caso conseguisse atingir Cairo, certamente desapontaria sua amada devido a impotência barbitúrica e muito provavelmente iria usar uma saída à inglesa...Cleo: I am british, no sex please! Ou, formulando a mesma questão de uma forma mais abrangente: cite algum grande personagem, de qualquer área do saber, sofredor de epilepsia como os quatro indivíduos mencionados e medicados por tempo prolongado com PB. Qual?
Muito provavelmente, a crença na eficácia monstruosa desta droga entre médicos, deve-se a sua ignorância da evolução natural da maioria das epilepsias: cura espontânea com o tempo. Assim, é melancólico atribuir a PB, ou aos seus próprios poderes, algo que aconteceria naturalmente.
Realço; neste princípio de século presenciamos PB sair de panacéia antiepilética para a de vilão; sobrando, todavia, indicações para sua utilização. Aliás, há urgente necessidade de um consenso para a definição de quando e como usá-lo; pois, em casos especiais, PB persiste sendo a única opção medicamentosa eficaz. Apesar disso, gostaria de lhes enfatizar mais uma vez... todos os indivíduos sofredores de epilepsia deveriam ter uma oportunidade de viverem sem os inconvenientes das drogas barbitúricas. 
Atenção: como PB continua sendo exageradamente prescrito entre nós, é comum encontrarmos pessoas com transtornos cognitivo-comportamentais secundários ao seu emprego. Aliás, em nossa sociedade é lamentavelmente freqüente vermos crianças e adolescentes vítimas deste abuso terapêutico, tendo péssimo rendimento escolar e comportamental; muitas delas estarão exibindo o rótulo de deficiente mental, sem na verdade o serem; e, pior ainda, induzidos a delinqüência.

FENITOÍNA ou FEIOTOÍNA Pesquisadores norte-americanos, prováveis misóginos radicais, descobriram fenitoína (PHT) ao final dos anos trinta do século passado e a apresentaram ao mundo como “grande droga antiepiléptica, indispensável no tratamento de pessoas com epilepsia”. Enfim, tínhamos uma droga mágica, aparentemente com “eficácia superior ao fenobarbital e menor toxicidade”. E quando se ganha uma guerra, a versão do vencedor passa a ser verdade inquestionável, geralmente assumindo caráter de dogma religioso. Apesar do estardalhaço inicial, PHT revelou ser uma droga com espectro de ação semelhante ao PB alemão e com efeitos negativos também. Alguém então sugeriu, hipoteticamente, que a combinação de PB com PHT teria efeito sinérgico e assim finalmente surgiu a “medicação ideal”, alcunhada de “comital” e difundida amplamente pelo universo.
Durante décadas, PHT (associado ou não a fenobarbital) foi usada massivamente no tratamento de pessoas com epilepsia, sem que ninguém ousasse comentar seus inúmeros e freqüentes efeitos colaterais desagradáveis. PHT é considerada uma droga antiepilética MAIOR e não discordamos disso; porém, todos que a prescrevem generosamente, deveriam igualmente ter em conta que ela é também a MAIOR causa de feiúra medicamentosa da atualidade. Aliás, neste aspecto, seu potencial é tão dramático que melhor seria chamá-la de “feiotoína”, tal a desgraceira estética que geralmente provoca nos seus usuários. Particularmente as mulheres pagaram um pesado tributo no passado (e muitas seguem sendo desfiguradas no presente), sendo alijadas do convívio social por apresentarem a síndrome feiotoínica clássica: brutal halitose, consequência de sangramentos provocados por gengivite hiperplásica; hirsutismo sutil ou generalizado e acne difusa.
Contudo, muitos colegas ainda têm a percepção dos seus defeitos ofuscados por uma crença fundamentalista em sua eficácia antiepilética; provável subproduto da colonização norte-americana. Desta maneira, sofismam sistematicamente na ânsia de enfatizarem suas virtudes e omitirem seus graves defeitos. É possível que feiúra confira status social em algumas sociedades desenvolvidas; mas, entre nós latinos, seguramente não. Num país ainda dominado pela ideologia machista, mulheres sofredoras de epilepsia já serão naturalmente discriminadas; dispensável agregar-lhes defeitos artificialmente criados. Por isso, preservar os indivíduos sofredores de epilepsia, em especial mulheres, dos inconvenientes comuns desta droga, deveria ser uma meta a ser perseguida por todo médico crédulo no sábio dito popular: prevenir é sempre melhor que remediar. Mais ainda, se levarmos em conta os honorários cobrados por dentistas, esteticistas, psicólogos e cirurgiões plásticos; profissionais geralmente envolvidos na tentativa de reparação.
Assim, mulheres, não importando qual faixa etária, deveriam ser poupadas da brutalização estética provocada por esta droga, que excetuando situações emergenciais, jamais deveria ser empregada como primeira opção no tratamento das suas epilepsias.
Infelizmente, misóginos existem, e em qualquer profissão. Porém, para aqueles que inocentemente patrocinam tal sorte de desatino, por uma fé messiânica na eficácia desta droga, urge um comentário adicional...doutor, o senhor com certeza prescreveria PHT para sua ex-mulher, mas recomendaria seu uso para sua filha ou para sua amante?
Atenção: Fenitoína é vendida no Brasil com os nomes fantasias de “hidantal” e “epelin”.
 
TOPIRAMATO  
Esta é a droga da onda. Foi desenvolvida como droga anti-epilética nos anos oitenta do século passado. E recebeu um alto investimento marqueteiro para se viabilizar como tal. Inúmeros relatos científicos, imensa maioria feitos sob encomenda e publicados nas revistas médicas mais confiáveis (sic), davam conta da sua eficácia em pessoas sofredoras de epilepsias parciais. Como droga anti-epilética revelou-se um fiasco; todavia, por casualidade, foi reconhecida como medicação eficaz na prevenção de ataques de enxaqueca – a prima irmã da epilepsia. Além disso, descobriu-se um efeito colateral, notável nos dias atuais – era emagrecedora. Pronto, eis aqui a medicação ideal para o tratamento das mulheres gordinhas sofredoras de enxaqueca.
Atualmente, é uma das drogas mais prescritas neste Brasil varonil. Impossível negar sua eficácia anti-enxaquecosa e de inibidora do apetite. Impossível negar também ser medicação de primeira escolha naquelas pessoas vitimadas pelo binômio epilepsia/enxaqueca; uma combinação mórbida freqüente, e, em qualquer sociedade. Porém, deveria ser igualmente impossível ignorar seus efeitos negativos. Não raro, apesar da sua eficácia na prevenção de ataques enxaquecosos ou epiléticos, ela deve ser suprimida pelo tormento que provoca na memória da usuária. Várias vezes escutei a mesma queixa e por isso mesmo faço questão de reproduzi-la ...doutor, estou bem em relação aos meus ataques; mas eu não consigo lembrar de nada. Em alguns momentos sinto-me perdida; não sei quem sou eu, o que faço, aonde moro e... etc.
Por isso, médicos atentos não deveriam perder de vista este trivial efeito colateral. Bem claro para mim que qualquer tratamento irá cobrar um tributo; mas convenhamos, a aniquilação da memória é demasiado exagerada para ser tolerada como tal. Observo que nenhum tratamento, seja ele qual for e por mais benéfico que seja, justificaria a perda da capacidade mental original. Afinal, se este for o preço cobrado para não ter crises, qual o ser racional que aceitaria pagá-lo? Mil vezes melhor seria seguir o calvário provocado por crises do que ficar livre das mesmas, mas com o cérebro mutilado e desprovido das suas virtudes de fábrica.
 
INAS, UM MODISMO PERVERSO
Fluoxetina, paroxetina, sertralina, etc; são consideradas as modernas panacéias contra a síndrome que grassa atualmente no mundo: tédio e melancolia mesclados com ansiedade recorrente. Tais sintomas costumam ser equivocadamente interpretados como sintomas de genuína depressão. A vida moderna é pródiga em fatores desencadeantes de transtornos emocionais. Na verdade está cada vez mais difícil encontrarmos o parceiro ideal e, mais ainda, um trabalho que seja gratificante e prazeroso. Algumas vezes se acha, mas o ambiente é demasiado insalubre e o assédio moral é uma aberração freqüente. Por outro lado, os meios de comunicação também não nos oferecem trégua. Por TV, rádio, jornal e internet, nossos cérebros são atormentados diuturnamente com insultos e propostas de qualquer natureza. Outrora se limitavam a estímulo consumista; porém, a modernidade agregou diversas alternativas e hedonismo a qualquer custo, talvez seja o principal. Como a Internet não dorme, não há mais insônia e solitário passou a ser palavra para definir o indivíduo que consegue dormir. Diante desta atmosfera moderna insana, com violência super banalizada, é absolutamente normal sobrevirem sintomas tais como tédio, frustração, raiva, desespero, idéias suicidas/homicidas, sexualidade aberrante e assim por diante.
Tais sintomas são agravados quando o Estado abdica de ser um agente educador e norteador da ética. Mas se levássemos em conta o exemplo da Itália nos anos setenta do século passado, chegaríamos à certeza de que qualquer sociedade pode se organizar e progredir apesar da atuação desastrada do poder estatal.
Por outro lado, Depressão é uma condição grave e que certamente existe. Quando identificada deveria ser tratada seriamente; entretanto, seu diagnóstico foi extremamente inflacionado entre nós. A maioria das pessoas que dizem sofrer de DEPRESSÃO, e tratadas farmacologicamente como tal, não são originalmente depressivas. São indivíduos expressando a sua maneira as vicissitudes da vida contemporânea, socialmente medíocre, onde Ansiedade com pitadas de Melancolia reacional são a regra geral. Todavia, há um grande e indisfarçável interesse econômico por traz desta prática censurável. Introduzida pioneiramente por uma multinacional norte-americana em 1987 com o prosaico nome de “prozac”, fluoxetina ganhou o mundo como a droga da felicidade. Sem qualquer escrúpulo, a droga revolucionária ganhou ares de solução para todos os “póbremas”, independente de como eles fossem qualificados; não importando se eles fossem de natureza conjugal, social, econômico ou enigmaticamente rotulado como psicológico. Enfim tínhamos uma droga mágica. E os filmes de Hollywood foram exemplares na sua propaganda. Recordo-lhes de uma cena exibida em um filme de Woody Allen, excelente comediante, mas desonesto mercador, onde no bidê do bom personagem havia uma caixa de prozac, configurando a mais asquerosa e detestável propaganda; pois, subliminar, registra no cérebro do espectador aquilo que seus olhos mal percebem. Desprezou-se por anos, a observação crescente entre médicos e pacientes de que os usuários estavam expostos a inúmeros efeitos negativos, entre os quais a abolição da sexualidade é quase uma constante e ideação suicida freqüente. Alguns profissionais, cooptados pela indústria ou simplesmente néscios na arte, chegaram ao cúmulo de afirmar que... as pessoas agora cometem suicídio graças ao prozac que lhes deu coragem para fazê-lo. 
Com seu estrondoso sucesso mercadológico, outras “inas” de multinacionais concorrentes, seguem brotando ao natural. No momento, já temos dezenas delas disputando este generoso “mercado da insanidade coletiva”; contudo, é dispensável qualquer bola de cristal para antever que “inas” ainda mais modernas que estas surgirão nos próximos anos. Seus arautos, bem pagos, continuarão enfatizando a velha lenga-lenga - doutor, esta é a droga que solucionará os problemas existenciais dos seus pacientes. Grotescamente se finge ignorar que não existem medicamentos capazes de solucionar diferenças conjugais crônicas ou deterioração psíquica induzida por um trabalho desagradável. Pior ainda quando não levam na devida conta que a abolição da sexualidade no usuário é um trivial efeito colateral que liquidará qualquer relacionamento. Além disso, não existem medicamentos para tratar assédio moral ou social, cada dia mais freqüente entre nós; enfim, que não existem formulações mágicas para tratar um indivíduo vivendo em desacordo com sua proposta existencial, seja ela qual for.
Finalmente neste tópico, gostaria de lhes recordar um acontecimento. Há cerca de quatro anos, matando tempo, li um especial da revista VEJA, dedicado às mulheres do Brasil (sic). Intitulava-se “Mulheres de A-Z”. Lia com toda atenção e lhes confesso que buscava no texto alguma novidade capaz de me ajudar a compreender o comportamento único das mulheres; porém, quando cheguei na letra “Z”, fiquei indignojado. Z significava “zoloft” e dizia mais ou menos assim...finalmente nós mulheres agora temos um medicamento para solucionar nossos problemas afetivos/depressivos, peça ao seu médico lhe prescrever “zoloft”, pois zoloft is all. Torpe propaganda; pois, este é o nome comercial pioneiro de sertralina. Escrevi, no mesmo dia, uma carta eletrônica ao editor comentando sobre os malefícios da propaganda enganosa veiculada pela revista; e, com paciência budista permaneço aguardando sua resposta. Logo, sugiro tomarem cuidado com revistas semanais deformativas, pois elas podem não ser tão éticas quanto apregoam ser. 
Definitivamente, penso que a humanidade deveria dedicar mais tempo a meditação/reflexão; e, além disso, buscar os prazeres oferecidos pelo contato com a natureza pródiga que nos rodeia. E este reencontro com a simplicidade existencial ofereceria a ela uma boa perspectiva de uma vida despilulalizada e gratificante.
 

DIAZEPAM E DERIVADOS
Diazepam é uma droga fabulosa para diversas situações. Por exemplo, não há medicamento igual para combater ansiedade, uma praga na sociedade moderna e também para interromper rapidamente ataques de epilepsia. Ela foi descoberta no final do século XIX e somente ao fim da II Guerra Mundial começou a ser utilizada. Neuropsiquiatras poloneses, a quem cabe a primazia do seu uso pioneiro, na capital Varsóvia semi-destruída e com uma população atormentada por ansiedade, testaram e ficaram maravilhados com sua eficácia. Comercializada pela multinacional Roche, ganhou o mundo com o nome fantasia de “valium”. Nas últimas cinco décadas desenvolveram-se cerca de 15-20 derivados desta droga, maioria delas tem em comum o sufixo “am”; assim surgiram: bromazepam, clonazepam, lorazepam, alprazolam, clobazam, midazolam, etc.
Qual o problema com droga tão boa? Não levamos em consideração que seu uso deveria ser circunstancial; isto é, deveria ser restrito àquelas situações de extrema ansiedade (ou para abortar crises de epilepsia prolongadas), incontroláveis por qualquer outro método não medicamentoso. Dependência, similar àquela provocada por álcool, é freqüente; além do fenômeno da tolerância... doses crescentes para se obter o mesmo efeito. Todavia, pior que estes defeitos, foram a constatação de que seu uso exagerado e por tempo excessivo, estava associado com prejuízo da memória recente e sintomas depressivos. Muito provavelmente, um contingente enorme de pessoas sofredoras de “depressão” da atualidade, tem no uso crônico de diazepam - ou derivados - a sua causa. Mais ainda se levarmos em conta, que muitos destes indivíduos também são consumidores de álcool, duas drogas que por atuarem em sítios semelhantes do sistema nervoso, tem seus efeitos potencializados.
Impossível deixar de ignorar o risco que benzodiazepínicos trazem para sofredores de transtornos do sono; em particular àqueles que roncam; estes passam a ter o risco de apnéia durante o sono aumentado sensivelmente e assim ficam expostos a doença vascular obstrutiva, em quaisquer órgãos.
Apesar de tudo, é previsível que drogas benzodiazepínicas, devido sua alta eficácia no combate a ANSIEDADE, um tormento na sociedade moderna, serão parte do nosso arsenal terapêutico por incontáveis séculos adiante. Porém, um emprego sábio das mesmas é requerido. E minha “bola de cristal” sugere que elas deveriam ser SEMPRE privilegiadas no tratamento daquelas pessoas sofredoras de ataques recorrentes de ansiedade, mas por um tempo limitado, discutido entre todos os envolvidos na sua assistência.

ASPIRINA E HEMORRAGIA DIGESTIVA

Se é Bayer é bom? Nem sempre! Aspirina, também conhecida por AAS (ácido acetil salicílico), foi usada pioneiramente pelos chineses há milhares de anos. Eles a obtinham intuitivamente através de um chá com a casca do “chorão”; um preparado hábil para combater dor e febre. Ao final do século XIX, pesquisadores alemães a sintetizaram em laboratório e esta descoberta enriqueceu a multinacional alemã, sendo seu “carro chefe” por muitas décadas. Claro que a milenar aspirina é uma boa alternativa em diversas situações, particularmente como antiagregante plaquetário (= afinador do sangue) na atualidade; porém, é obrigação reconhecer que esta droga aparentemente inocente é responsável por diversas internações emergenciais. É, muito provavelmente, a causa mais banal de sangramentos digestivos de intensidade variável. Por outro lado, é bem sabido que álcool potencializa sua natural agressão à mucosa gástrica; aliás, esta é uma combinação infeliz, freqüentemente associada com episódios de hemorragia digestiva. Assim, transmita aos seus que medicamentos contendo aspirina nunca deveriam ser usados na prevenção ou tratamento da vulgar ressaca. Além disso, mantenha sob vigilância todo o usuário prolongado desta substância, mesmo que em doses diárias mínimas. Caso estes desenvolvam anemia, hemorragia digestiva crônica é o diagnóstico primeiro e seu emprego deveria ser imediatamente suspenso. E jamais cometam a insensatez de usá-la em uma pessoa sob suspeição de dengue; uma condição ainda epidêmica em vários locais do mundo, cuja variante hemorrágica será piorada por esta substância.
Ironicamente, há anos é veiculado na mídia o nome de um produto espetacular para prevenir ressaca. Chama-se “engov” e um dos constituintes da sua fórmula é ASPIRINA. É possível inferir o número exagerado de usuários que desenvolvem hemorragia digestiva no dia seguinte a noites generosas. E é de se lastimar o silêncio cúmplice das autoridades sanitárias.

CINARIZINA E FLUNARIZINA – DROGAS LEGAIS?
Desde há cerca de 30 anos estas drogas são bizonhas panacéias antilabirinto. Na verdade são prescritas para todo infeliz em nossa sociedade que ouse se queixar de “tontura”. Elas são oferecidas nas farmácias nacionais com 10-20 nomes comerciais diferentes, sendo “stugeron” (cinarizina) e “vertix” (flunarizina) os mais conhecidos. Ambas possuem habilidade ímpar para bloquear um neuro-transmissor muito importante chamado dopamina, essencial na modulação do humor e da motricidade também. Criminosamente suas “burlas” não dão à devida atenção; bem ao contrário, ao enfatizarem seus formidáveis efeitos cerebrais induzem a automedicação (melhor seria dizer auto-intoxicação). E colegas médicos, ludibriados na sua boa fé, seguem prescrevendo quantidades generosas destas substâncias. Em conseqüência do progressivo bloqueio dopaminérgico, dois sintomas graves se manifestam: melancolia e/ou parkinsonismo. Assim, é uma desagradável rotina encontrarmos vítimas de intoxicação crônica por estas drogas, ostentando os diagnósticos de Depressão ou de doença de Parkinson, não raro coexistindo na mesma pessoa. A tragicomédia é incrementada de modo dantesco quando médicos especialistas, ao invés de identificá-las como etiologia e suprimi-las, recomendam medicamentos antidepressivos e antiparkinsonianos para o tratamento de seus vulgares efeitos colaterais.
Por favor, tenha em conta que tontura é um dos sintomas mais comuns em qualquer consultório médico (e igualmente em salão de cabeleireiros) e como pode expressar distintos problemas de saúde, sua causa deveria ser objeto da mais judiciosa avaliação clínica em todos os seus sofredores. Entretanto, como cinarizina/flunarizina foram guindadas a posição de panacéia para o seu tratamento, é possível imaginar a quantidade enorme de pessoas iatrogenizadas pelo uso destas substâncias entre nós. Como indivíduos idosos são os mais vulneráveis aos seus efeitos tóxicos, recomendo-lhes fortemente investigar o uso destes medicamentos em todos seus conhecidos, amigos ou familiares que estão em tratamento por suposta doença de Parkinson ou Depressão. Tenho firme convicção que irão encontrar um fantástico número de flagelados pelo uso delas. Por esta razão, embora legais, urge um controle das mesmas, restringindo sua compra e inibindo a auto-intoxicação. Além disso, todos os produtos comerciais contendo estas substâncias deveriam ter claramente expresso em suas bulas: ATENÇÃO, O USO DESTA SUBSTÂNCIA PODE CAUSAR SINTOMAS DE DEPRESSÃO E DE PARKINSONISMO.
 
NEUROLÉPTICOSDrogas neurolépticas são utilizadas fundamentalmente no tratamento de desordens neuropsiquiátricas; em especial nos vitimados pela síndrome esquizofrênica. Clorpromazina, um derivado fenotiazínico, foi a droga pioneira deste grupo. Ela foi lançada nos anos cinqüenta do século passado e os resultados iniciais foram intensamente celebrados. Os mais entusiasmados afirmavam que a síndrome esquizofrênica seria exterminada. O tempo demonstrou que quem seria exterminado eram os próprios pacientes, graças aos seus inúmeros efeitos deletérios. Grande parte da população usuária desenvolveu com o passar dos anos, terríveis transtornos motores denominados de Discinesia Tardia. E tais alterações são definitivas, inexistindo qualquer tratamento eficaz. E a paquidérmica psiquiatria ortodoxa deveria ser incriminada por mais este crime
Recentes descobertas têm sido feitas, resultando em neurolépticos com menor toxicidade motora e que por isso mesmo, promovem um melhor convívio social. Entretanto, é necessário ainda um bom tempo de observação para que esta impressão inicial se confirme e que seus efeitos negativos, alguns ainda incógnitos, se manifestem.
Todavia, é dispensável qualquer sentimento iconoclasta para se ter à percepção de que disfunções neuropsiquiátricas exigem algo mais que medicação. Estas pessoas deveriam ter acesso a métodos que privilegiem práticas humanistas que resgatem sua convivência social. E há inúmeras opções não farmacológicas para se obter isso. Com certeza, deveríamos aprender com as sociedades rotuladas como “primitivas”; pois, embora possa parecer paradoxal, elas ainda possuem vestígios de cultura verdadeiramente humanista da qual poderíamos tirar algum ensinamento.

DIGITAL 

Digitalis purpúrea (“digoxina”, “digitoxina”) tem sido usada como droga cardiotônica desde há séculos. Identificada como causa de arritmias cardíacas sérias, no momento está sendo abandonada. Deixa um rastro formidável de mortes. É muitíssimo provável que milhões pereceram graças a seus efeitos colaterais, tardiamente reconhecidos. Paracelsus foi mais uma vez ignorado... a dose apropriada era infinitamente menor daquela que se supunha como ideal.
Um efeito colateral positivo? Como curiosidade atribui-se a esta substância alguns dos maravilhosos quadros do pintor holandês van Gogh. Razão? Xantopsia (=visão amarelada) é um dos seus efeitos colaterais mais triviais e é fato bem documentado que ela foi empregada no seu tratamento; pois à época lhe eram atribuídas propriedades anti-psicóticas. Assim, a fase da sua produção amarelada deve ser creditada ao digital. Novamente mal empregado, afinal esta pessoa genial sofria de epilepsia, sobre a qual nenhum benefício é observado.

ANTI-INFLAMATÓRIOS NÃO HORMONAIS

Certamente que são capazes de aliviar dores diversas, particularmente das articulações, e poucos da nossa espécie depois dos quarenta anos estará livre deste tormento. A maioria de nós, à medida que envelhecemos irá sofrer de artrose, um tipo benigno de reumatismo. A sapiência popular refere-se a este fenômeno fisiológico com bom humor, é a idade do condor dizem. Ora com dor aqui, ora com dor acolá. Contudo, todas estas drogas possuem diversos efeitos indesejáveis. Por exemplo, nefrotoxicidade importante e, além disso, agridem a mucosa gástrica de maneira análoga à aspirina, que, aliás, está inserida neste grupo. Graças a um marketing bem sucedido são consideradas inocentes; diclofenato de sódio, a principal delas, é largamente prescrita, ensejando grotesca subestimação da sua toxicidade. Em conseqüência, casos de perfuração gástrica repetem-se nas emergências configurando uma entediante e perversa farsa. E muitos sofredores de Hipertensão Arterial Sistêmica e de Insuficiência Renal têm no seu uso crônico a mais óbvia causa.
Ainda mais recentemente, um suposto revolucionário antiinflamatório, vendido com o singular nome de “prexige”, foi identificado como promotor de inúmeras mazelas físicas e por isso seu emprego tem sido questionado. Mas, outros se seguirão e com conseqüências similares; por esta razão, a sociedade deve “pré-exigir” doravante testes toxicológicos sérios para todas as novidades farmacêuticas. Além disso, esta aberração deveria nos alertar para uma busca por alternativas não medicamentosas e eficazes no tratamento de pessoas sofredoras de dor crônica.

ANTI-HIPERTENSIVOS

A pressão arterial das pessoas tende a um aumento gradual com o passar dos anos e, além disso, ela sofre oscilações ao longo do dia. Tais fatos são frequentemente ignorados. Assim, é comum encontrarmos pessoas exibindo sintomas de hipotensão arterial, tais como tontura, fraqueza, sonolência diurna, etc, em uso de medicação anti-hipertensiva; pois foram equivocadamente diagnosticados e tratados como sofredores de Hipertensão Arterial.
Recordo-lhes que até recentemente o uso abusivo de diuréticos para o seu tratamento, era a causa mais comum de câimbras (devido diminuição do nível sanguíneo de potássio) e como ainda são muito utilizados, o uso destas substâncias deveria ser checado em todo indivíduo que as exibe, particularmente quando associadas a fraqueza e tremor em mãos.
Drogas beta-bloqueadoras (propranolol, atenolol, metoprolol, etc) devem igualmente ser objeto de comentários. Elas constituem um grupo de substâncias empregadas em diversas situações, particularmente em sofredores de Hipertensão Arterial Sistêmica e de Insuficiência Coronariana (angina pectoris); e, na Neurologia, como profilático de ataques enxaquecosos e no alívio de Tremor Essencial. Todavia, também estão associados com inúmeros efeitos desagradáveis. Destacando-se fraqueza universal (síndrome miastênico); insônia/alucinações; impotência sexual, entre outros. Além disso, podem desencadear ataques de asma e dificultar o controle de diabetes mellitus. Embora constituam drogas muitas vezes indispensáveis, seus efeitos colaterais nunca deveriam ser perdidos de vista.
É importante observar que Hipotensão Arterial Sistêmica, de maneira análoga a Hipertensão Arterial Sistêmica, expõe a vítima a um risco significativo de doença vascular obstrutiva; infartos cerebrais ou cardíacos são as complicações mais graves.

BOTOX 

A sociedade ocidental é realmente insaciável na busca da felicidade. Desde há séculos, consome álcool em doses cavalares para acalmar seus demônios; descobriu as drogas benzodiazepínicas na década de 60 e desde então se empanturra delas; e a partir de 1987 (ano da pioneira – fluoxetina) encontrou equivocadamente nas “inas” a solução de tédio crônico mesclado com ansiedade recorrente. Difícil encontrar uma mulher atualmente que já não as tenha experimentado. Aliás, dificílimo encontrar uma de meia idade que não esteja em uso de alguma delas. A moda bizarra pegou até entre veterinários; pois cachorros e gatos urbanos, seqüestrados em apertamentos, naturalmente adoecem e surrealmente também estão sendo “tratados” com estas panacéias.
Como a existência continua sofrida... afinal sempre há algum defeito grave para ser corrigido, explodiram as clínicas de cirurgia plástica; e, a bem da verdade, um fenômeno não restrito a tropicalândia. Assim, chegamos na reparação estética como a solução ideal para uma problemática de relacionamento milenar. É cirurgia para tudo e para todos também; não havendo limites de nenhuma espécie. Na expectativa de conquistar clientes afetados por vaidade doentia, até o baixo clero tem sido contemplado com financiamento. E o número de vítimas incrementa na mesma proporção; ora, se procedimentos de risco são vulgarizados, tragédias acabam banalizadas no cotidiano.
Para piorar a situação eis que chega a toxina botulínica como medicamento espetacular. Botox é o nome comercial mais afamado da coisa. Para os mais novos, segue uma informação adicional. Toxina botulínica é aquela mesma velha conhecida das nossas avós; elas a temiam quando faziam suas conservas artesanais e por isso mesmo tinham cuidados especiais no seu preparo. Elas sabiam de uma doença antiguíssima e freqüentemente fatal chamada botulismo – paralisia do corpo devido intoxicação por toxina botulínica veiculada em conservas mal preparadas. Pois bem (deveria escrever pois mal), pesquisadores na década de oitenta, descobriram nela uma boa alternativa para tratamento sintomático de diversas condições neurológicas que cursam com rigidez muscular ou distonia. E realmente é mister lhes dizer que ela poderá ser de grande utilidade em algumas destas situações. Todavia, extrapolou-se abusivamente sua indicação e atualmente, pasmem, ela concorre com a cirurgia plástica no mórbido afã de perpetuar beleza estética. E definitivamente virou moda social. Assim como temos alopatas, homeopatas, agora temos também os botoxisopatas que usam “à bangu” seu poderoso “medicamento” anti-velhice.
O frenesi é tal que efeitos destes modismos são evidentes em qualquer roda social composta por indivíduos pertencentes às classes alta e média, e em curto tempo, serão igualmente perceptíveis entre freqüentadores de bailões da periferia. Dias atrás uma amiga espirituosa contou-me detalhes de um baile aristocrático em que participou. Tive acessos de risos com seu relato. Jamais irei declinar seu nome, tão-pouco o local onde isto aconteceu; mas é bastante provável que o mesmo possa ser visto em qualquer outra cidade brasileira. Inspirado nela segue este relato....Paulo, o tamanho da barriga é uma das causas físicas, em todos os sentidos, de separação dos casais de meia idade; ah, e as rugas e o tamanho dos seios também. A lipoaspiração resolveu o primeiro deles; botox liquidou as rugas; e baldes de silicone fizeram as mulheres voltarem a exibir as mamas da mama. O problema é que os desencontros permanecem; se agora já é possível as partes baixas se roçarem durante uma dança, o tamanho exagerado do peitoril duro impede um contato pleno e o que é pior, como manifestar tesão por alguém incapaz de sorrir. Seria mil vezes preferível ver o rosto da amada, mesmo enrugado, demonstrar alguma emoção, do que contemplar uma face botoxicada, estilo oriental, onde além de ser impossível vislumbrar sua idade, desgraçadamente ignora-se seu sentimento.
Como Homem, constato aborrecido ver homens aderirem à moda da vaidade mórbida; eles estão igualmente se embotoxicando, se lipoaspirando e se siliconizando também. Humanos deveriam tentar manter a serenidade, a qualquer custo; até para justificar a auto adjetivação sapiens. Talvez a meditação seja um eficaz medicamento contra este flagelo transformista que deteriora suas vidas. Talvez qualificados psicólogos possam ser úteis. Mas, um maior contato com a natureza, cujos efeitos positivos são subestimados na sociedade moderna, dispensaria qualquer comentário adicional. Porém, desconfio que egocídio seria indispensável na resistência a modismos bizarros. Liberdade, sem adjetivação, é a solução, e para todos os animais, independentemente da sua qualificação zoológica.

COLESTEROL 

Um outro assunto interessante a ser comentado neste artigo é o relacionado à cultura do colesterol. Durante décadas, o aumento sérico do colesterol total foi venerado por nós, como um inimigo a ser combatido ferozmente e, aliás, muitos médicos gastaram (alguns continuam gastando) sua vida fazendo esta apologia. Atingimos o orgasmo científico quando descobrimos a dualidade do bom e do mau colesterol. Apesar disso, reconheço não haver dúvida quanto a sua contribuição na gênese da doença vascular obstrutiva, particularmente quando níveis exagerados são detectados. Todavia, considerando hipercolesterolemia como um grande fator de risco para o desenvolvimento de aterosclerose, obrigamos milhões de indivíduos mundo afora, modificarem seus hábitos alimentares tradicionais, na expectativa de protegê-los contra um dos principais males deste século. Recordo até uma cena da minha infância, com nossa mama, ludibriada na sua boa fé, ordenando a nossa secretária: Benta, banha e manteiga never more, de agora em diante faça todas as frituras com seboclim. E como nossa comida trivial; mas, excelente, se maquidonaldizou tão de repente! A resultante deste processo, em termos de colesterolemia, imagino ser zero.
Entretanto, contestando parcialmente este mito, um artigo proveniente de uma das mais tradicionais universidades holandesas e publicado recentemente, afirma textualmente em suas conclusões... em pessoas acima de 85 anos de idade, concentrações altas de colesterol total estão associadas com maior longevidade e menor mortalidade por câncer e infecções. Pensem comigo, vale a pena ser tão radical em recomendações nutricionais para pacientes idosos, sonegando-lhes o prazer de consumirem alimentos à que estão habituados há décadas?
Encerrando este tema, uma questão básica; afinal, qual seria o nível normal de colesterol? Ninguém sabe! Mas, o uso de sinvastatina (ou similares) na atualidade, para sua redução, é tão exagerado que torna impossível ser ignorado. Com certeza é mais um modismo ridículo. É tragicômico notar a generosidade na sua prescrição; sendo raridade na atualidade não vê-la incluída no rol de medicamentos usados por pessoas de mais de cinqüenta anos de idade. Tal qual fluoxetina, especialistas das mais diferentes áreas, convencidos da sua eficácia protetora, estão prescrevendo-a de modo indiscriminado. Infelizmente não levam em conta seus efeitos colaterais e por esta razão é fato corriqueiro ver seus usuários ostentarem o diagnóstico de fibromialgia. Ora, dores musculares são um dos efeitos mais vulgares desta droga e sua simples supressão, por si só, eliminaria mais uma doença artificialmente provocada.

EXEMPLOS DE IATROGENIA NÃO MEDICAMENTOSA

Seguem três exemplos de iatrogenias não medicamentosas. A primeira delas, praticada largamente até recentemente, foi a moda da botinha ortopédica. Esta era recomendada sistematicamente para desafortunadas crianças supostamente sofredoras da síndrome do pé chato. Por décadas o público infantil foi vitimado por esta fraude e seus pais sendo compelidos a comprarem a engenhoca e forçarem seu uso, na expectativa da correção de pseudo-anormalidades criadas pela indústria e alguns colaboradores médicos. Certamente este modismo bizarro, acabou por desencadear tremenda ciumeira entre irmãos, primos, vizinhos da vítima e até colegas de aula, enfim todos desejavam igualmente a tal botinha que conferia ao usuário o status de coitadinho da mamãe e por isso mesmo merecedor de afagos paternais diferenciados. Déficits psicológicos variados, além daqueles de natureza pecuniária, podem ser facilmente identificados na grande população afetada por esta prática irracional, de franca inspiração philantrópica.
Uma outra que está em franco frenesi social é o uso de aparelhos dentários diversos. Com toda certeza, muitas pessoas exibem alterações dentárias que justificam seu emprego. Mas, será que todo este mundaréu de pessoas que vemos nas ruas ostentando aparatos ortodônticos tem real indicação para tal?
Por fim, a estúpida hidratação generosa continua liquidando pessoas idosas internadas em hospitais. Aliás, intoxicação por água, é uma causa mortis super banalizada e pouquíssimas vezes é aceita e reconhecida por nós médicos. Frascos de sorinho continuam sendo prescritos de modo anárquico, até que suas vítimas exibam sinais neurológicos óbvios de hiponatremia. Correção igualmente desastrada da mesma é o último ato desta espécie de crônica da morte anunciada. Esta sobrevém como natural conseqüência e a responsabilidade pelo desfecho funesto é rapidamente transferida para a idade da vítima. Ao invés da revolta, familiares aceitam o fenômeno de maneira dócil... afinal estava tão velhinha (o). E quanto maior for sua herança e o número de pilantras nela interessados, mais fácil ocultar fatos abomináveis. É tragicômico observar que os atestados afirmam que morreram de parada cardíaca. Esta é mais uma doença artificial, típica de hospital e somente muito raramente vista fora deste ambiente. A simples aplicação de aritmética básica (ou de bom senso) na correção de distúrbios hidroeletrolíticos em idosos seria uma medida altamente eficaz para preveni-la. Muitos morrem de sede neste planeta; porém, convenhamos, morrer intoxicado por água em um ambiente onde se supõe estar protegido, deveria ser identificado como crime hediondo. Por ironia ou conveniência social mórbida é rotulada como natural.
 
PROVÉRBIO HINDU
Finalizando, gostaria de lhes deixar um antigo provérbio hindu, cuja lembrança e aplicação promoveriam uma drástica redução do número de pessoas intoxicadas por medicamentos entre nós – Medicina é a arte de entreter a doença enquanto a mãe natureza faz o seu papel.
Com certeza, ele não deveria ser interpretado como um dogma religioso, mas sim como uma regra simples para um emprego sábio dos nossos venenos. E, com sinceridade, pessoas atormentadas por problemas de saúde não precisariam usar tantos medicamentos como sugere a monstruosa indústria farmacêutica. E os responsáveis por sua prescrição, jamais deveriam perder de vista o potencial tóxico que todo ele carrega consigo. E para facilitar esta compreensão, o ensino de Toxicologia – quase inexistente - deveria ser incrementado nas escolas médicas do Brasil.
Desgraçadamente a picaretagem transformou-se em um mal universal e práticas similares estão acontecendo em qualquer parte do mundo e em qualquer outra atividade também. Profissionais íntegros e de índole crítica são capazes de identificá-las com facilidade. Deles se espera reação diante da tirania mercadológica que torna insultuosa a prática médica atual.
P.S.: Este “vômito literário” é conseqüência de trinta anos de náuseas, provocadas pela percepção de como esta profissão se tornou gradualmente refém da indústria farmacêutica. Medicina é uma arte, e aqueles que com ela se identificam, deveriam ser capazes de liderar uma insurgência contra falaciosos de todos os matizes que maculam seu exercício. A philantropia dopaminada deve ser combatida, pois do contrário, iremos acabar na vala comum do descrédito popular. E a palavra do bom curandeiro, sempre útil no alívio de qualquer sofrimento, irá perder sua eficácia. E, definitivamente, não há nenhum medicamento mais eficaz que as palavras de um médico educado, bem humorado e otimista no trato de seus pacientes. Dispenso honestidade como qualificação, pois a considero pré-requisito básico para uma prática brilhante de qualquer profissão. Que outros tipos continuem tagarelando e mentindo; todavia, nós não deveríamos cometer tal sorte de sacrilégio.
Convicto, a implantação de Disciplinas de Toxicologia em todos os Cursos de Medicina, de qualquer país, iria contribuir para os futuros médicos conhecerem os efeitos colaterais da sua profissão e minimizarem sua toxicidade. Mas, com a proliferação espantosa de tantos cursos de Medicina Brasil afora e sem qualquer controle de qualidade; não posso me iludir, isto é uma utopia. Seguiremos em direção ao pântano de maneira idêntica a outras categorias profissionais.
Finalizando, e para que não me interpretem mal, saliento - minha ética foi e sempre será devotada à profissão. E o estilo, como dizia Schopenhauer, é a fisionomia da alma. E, como tenho uma única, que se mantêm rebelde e transparente ao longo da minha existência, aproveito para expressar a ela minha gratidão.

Florianópolis, 17 de Novembro de 2008.
Dr.Paulo César Trevisol Bittencourt
Professor de Neurologia/UFSC
www.neurologia.ufsc.br

DEDICATÓRIA:
À Freya Gross, artista e pessoa inigualável, morta recentemente, vítima de grotesca iatrogenia em um hospital de Santa Catarina.
 
DADOS DO AUTOR:
Paulo César Trevisol Bittencourt é natural de Jacinto Machado (capital da banana), extremo sul de Santa Catarina. Graduado em Medicina pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); Neurologista pelo Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná. Especializado em Epileptologia pela Universidade de Londres e Mestre em Medicina. Atualmente é professor Adjunto de Neurologia do curso de Medicina da UFSC. É membro titular da Academia Brasileira de Neurologia desde 1986 e por vinte anos (+ -) foi presidente do Centro de Estudos do Hospital Universitário/UFSC.